A História da Índia que conhecemos é envolta em mistérios e estereótipos. Aprendemos com novelas, romances e programas de televisão que a Índia é rural, que os indianos não comem carne, que as mulheres não têm liberdade e que não há democracia no país. Com o intuito de derrubar esses mitos e atender à uma demanda pública cada vez maior sobre o país asiático, o historiador Emiliano Unzer, professor do Departamento de História da Universidade Federal do Espírito Santo, organizou uma série de 14 aulas sobre a História da Índia, disponibilizada gratuitamente em seu canal no YouTube.
As aulas estão organizadas por períodos históricos, abrangendo povos, culturas e governos que vivem na região, desde a antiguidade até os desdobramentos da Constituição indiana, de 1950. Os vídeos utilizam muitas imagens e possuem uma linguagem acessível e didática, o que contribui para que pessoas não familiarizadas com a história do país possam acompanhar as aulas sem dificuldades.
Ao Café História, o historiador disse que a história indiana é muito fascinante. “A história da Índia assombra e fascina pela riqueza caleidoscópica. De acordo com o professor Vinay Lal, da Universidade da Califórnia, Los Angeles, a Índia foi uma região de múltiplas convivências das diferenças e marcada pelo cosmopolitismo.”
Unzer também destacou a grandiosidade do pensamento dos povos que ocuparam a região: “Acredito que as ruínas de Harappa e Mohenjo-Daro, do terceiro e segundo milênio antes de nossa era, no Vale do Indo, são espetaculares, por apresentarem uma sofisticada noção de organização urbana, sanitária e dos seus impressionantes registros visuais e de escrita – que permanece até os dias atuais indecifráveis. Há indícios de um próspero comércio com regiões mais ao oeste na Mesopotâmia e eventuais contatos com regiões chinesas do vale do Sichuan.”
Povos como protagonistas
Na série, Unzer descreve os diversos povos que formaram a Índia como protagonistas da sua própria história. “As batalhas desses povos foram depois reunidas e compiladas num dos maiores épicos da literatura indiana e mundial: “Maabárata”. Nesse contexto, aparecem sinais da vida sedentária, da agricultura, e de novas divindades e filosofias. Os antigos deuses dos arianos, que eram meio nômades, do sol, fogo, deixam de ser tão cultuados para dar lugar a outras divindades hoje proeminentes no universo indiano […]. Em um dos reinos no norte indiano, perto de Lumbini, nascerá um príncipe, Sidarta Gautama, que depois irá propor uma nova crença e sistema, o budismo, junto com um de seus contemporâneos, Mahavira, no jainismo. Os últimos séculos antes de nossa era foi um período fértil e conturbado.”
Já no que diz respeito à contemporaneidade, Emiliano contribui para a quebra de estereótipos sobre a rigidez e a opressão apontadas à sociedade indiana: “Acredito que a democracia indiana se manteve desde sua independência em 1948. A constituição em vigor desde 1950 é um monumento à diversidade e inclusão das diferenças indianas. A Carta deles reconhece mais de 20 línguas oficiais, centenas de outras línguas e dialetos, afirma um Estado laico e secular, protege minorias (como os dalits, brilhante obra de Ambedkar) e proíbe discriminações com base étnica e de castas. Acredito que isso seja motivo para celebração de toda a comunidade internacional, um país com mais de um bilhão e 300 milhões de pessoas, dezenas de línguas e escritas com séculos de tradição […]. Uma democracia com mais de 900 milhões de votantes de acordo com as últimas eleições de 2019.”
Última aula ainda vai ao ar
Em suas vídeo aulas sobre a Índia, Unzer alia a beleza de contar boas histórias às reflexões próprias do conhecimento e do fazer histórico. O professor destaca rupturas e continuidades, contradições, bem como dúvidas e questionamentos que permanecem vivos. A última aula da série ainda vai ao ar. Mas pode ser que venha mais conteúdo sobre o gigante asiático no futuro, a depender da demanda do próprio público.
Unzer pesquisa a história do continente asiático há sete anos. Seu livro intitulado “História da Ásia” reúne os estudos desenvolvidos ao longo desse período, na íntegra. É possível adquiri-lo na Amazon, de forma digital e impressa. Seu projeto de divulgação científica abrange não apenas o canal no YouTube, mas também o perfil de Instagram “História da Ásia”.