O mês de agosto não marca tão somente a volta às aulas depois das férias de julho, mas traz também datas importantes no ambiente escolar: o Dia do Estudante, no dia 11, e o Dia do Historiador, no dia 19. Para celebrar estas efemérides, trazemos a crítica de um filme oscarizado, disponível no Amazon Prime Video, protagonizado justamente por um estudante e seu professor de História, numa narrativa cativante sobre a criação de laços em ambiente escolar.
Natal de 1970. Um professor de História impopular, uma cantineira enlutada e um aluno “loser” criam laços duradouros em meio a uma situação atípica. Angus Tully (Dominic Sessa) se junta a quatro alunos que ficarão no colégio durante o recesso de fim de ano, sob os cuidados do professor Paul Hunham (Paul Giamatti), convocado de última hora para essa missão. Preparando as refeições para eles está Mary (Da’Vine Joy Randolph), cantineira cujo único filho morrera naquele ano, lutando na guerra do Vietnã.
Hunham faz de tudo para manter a rotina de estudos dos estudantes, até que o pai de um deles vai de helicóptero buscá-lo para levá-lo para esquiar. Quase todos os demais alunos recebem um OK do diretor e de seus pais para irem junto. Quase: os pais de Tully não conseguem ser localizados e ele terá de ficar na escola.
Numa conversa no início do filme, o diretor Hardy (Andrew Garman) relembra e mais uma vez repreende Hunham por ele reprovar o filho de um senador, que já havia recebido uma carta de aceite de uma universidade de prestígio – Hunham deveria, na ocasião, não ter “ignorado a política”, mesmo classificando o aluno como “troglodita”. Era um caso em que “um gambá cheira o outro”, afinal, o aluno troglodita não apenas era filho de alguém importante, mas despertava um mecanismo de identificação com o diretor Hardy, que já havia sido aluno de Hunham há muitos anos – e era também péssimo.
Respeitando a época do ano durante a qual o filme se desenrola, a trilha sonora é permeada por clássicos de Natal. Além destes, podemos ouvir pedaços de grandes hits do começo dos anos 70. Por falar em atmosfera, há toda uma intenção de fazer o filme ter o estilo do que estava sendo filmado em 1970. Para servir de inspiração, o diretor Alexander Payne exibiu para o elenco e equipe clássicos da década, entre eles o cult “Ensina-me a Viver”, de 1971.
Numa visita ao museu, Hunham diz a Tully que é preciso olhar para o passado para entender qualquer questão do presente. Isso é a História: uma explicação do presente. Foram palavras bonitas como essas – que a História serve para compreendermos o presente e não repetirmos os mesmos erros no futuro – que me levaram a escolhê-la como profissão. Fazer História é muito mais que apontar anacronismos na fantasia do Papai Noel ou elogiar um filme pelo retrato fiel das tradições dos índios Cheyennes. Também não é ensinar História até virar História, embora seja possível passar vários anos em uma mesma instituição de ensino. Fazer História é, com o H maiúsculo que a disciplina merece, encontrar nela um guia para uma vida melhor.
Hunham afirma que seu trabalho como professor é “zero respeito e o salário pior ainda”. Esta reclamação vem de um filme ambientado mais de 50 anos atrás, mas ainda é uma realidade. Ser professor é cada vez mais um desafio, seja pela remuneração, baixo prestígio da profissão, questões como necessidade de modernização para usar novas tecnologias na sala de aula, algo que foi acelerado com a pandemia, ou mordaças morais como ameaças ao discurso livre e proibição de temas e obras literárias.
Após visitar o pai, Tully desabafa com o professor Hunham, que afirma com todas as letras que ninguém é o próprio pai. O poder da genética e hereditariedade muitas vezes nos assombra, mas não podemos nos esquecer de que somos seres com livre arbítrio – mesmo que os gregos antigos dissessem que “os passos que você dá para evitar seu destino são os mesmos que te levam de encontro a ele”.
Da’Vine Joy Randolph ganhou o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por sua interpretação em “Os Rejeitados”. Sua cena mais emocionante não precisa de palavras: é Mary colocando com todo esmero na gaveta da irmã roupas de bebê usadas e agora sem serventia para ela. Mary é coadjuvante no sentido literal da palavra, uma vez que não é uma personagem bem desenvolvida. Seu luto, por exemplo, poderia ter sido explorado mais a fundo. Paul Giamatti, no que pode ser considerado o melhor papel de sua carreira, ganhou o Globo de Ouro de Melhor Ator em Filme de Comédia ou Musical.
“Os Rejeitados” me lembrou de dois dramas feitos na época em que se passa este filme, ambos sobre internatos de meninos. O primeiro foi “Se…”, de 1968, sobre um colégio interno inglês onde alunos subjugados por seus superiores se rebelam. O segundo foi “Child’s Play”, de 1972, também sobre um professor impopular, interpretado pelo grande James Mason. Por outro lado, a inspiração principal para “Os Rejeitados” foi “Merlusse”, de 1935, cuja premissa de um professor impopular ficando com alunos durante as férias de Natal foi reaproveitada por Alexander Payne, que contratou o roteirista David Hemingson para trabalhar sobre a ideia original – uma escolha ousada, já que Hemingson tinha experiência apenas escrevendo para TV, não para o cinema. Entretanto, o filme foi acusado de plágio pelo roteirista Simon Stephenson, cujo roteiro ainda não filmado intitulado “Frisco” em muito se assemelha a “Os Rejeitados”, e já havia sido mostrado e recusado por Payne. O processo ainda corre na justiça.
Narrativas sobre a vida escolar sempre me chamaram a atenção, talvez por ser filha de professora. Embora a minoria da ação ocorra dentro da sala de aula, “Os Rejeitados” se junta à lista de grandes filmes ambientados em escolas, com um final previsível, mas mesmo assim uma agradável sessão.