“O Conde de Monte Cristo”: produção francesa revisita a obra de Alexandre Dumas

O Conte de Monte Cristo, uma das histórias mais famosas de queda, ascensão e vingança da literatura mundial recebe novo tratamento fiel às suas características originais.
3 de dezembro de 2024
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"O Conde de Monte Cristo", adaptação mais recente do clássico romance de Alexandre Dumas. Foto: Paris Filmes.

Quantas vezes já não vimos ser repetida – no teatro, cinema ou TV – a narrativa de um(a) personagem de coração puro, alma nobre e sem muitos recursos financeiros, iniciar em sua vida uma nova fase de sucesso no trabalho e no amor, a qual acaba atraindo o ódio e a inveja daqueles que cobiçam suas modestas conquistas? Quantas vezes não acompanhamos o sofrimento desse personagem que acaba despido, pelas pessoas em quem mais confiava, de tudo que conquistou a duras penas? Quantas vezes não vibramos com o acaso, oferecendo a esse personagem, riquezas e a oportunidade de realizar uma elaborada vingança? O Conde de Monte Cristo – livro de 1846 e escrito em colaboração pelos autores Alexandre Dumas e Auguste Marquet – festeja essa fórmula há mais de 150 anos. É, reconhecidamente, um dos romances de aventura mais famosos da literatura francesa.

A nova releitura desse clássico é dirigida, escrita e produzida pelos parceiros na arte Matthieu Delaporte e Alexandre de La Patellière (Le Meilleur Reste à Venir /2019). O filme estreou no programa do 77º Festival de Cinema de Cannes, e teve uma recepção efusiva com standing ovation da plateia presente. No Brasil a produção fez parte do programa do Festival Varilux de Cinema Francês no começo de novembro de 2024 e tem estreia nos cinemas nacionais programada para o dia 05 de dezembro. A produtora Pathé Films, que tornou sua missão a representação fiel de clássicos da literatura francesa, já tinha sido responsável pelo sucesso de Os Três Mosqueteiros em 2023. Agora em O Conde de Monte Cristo a façanha é repetida.

Para os poucos ainda não familiarizados com o romance, o filme acompanha a trágica história de Edmond Dantès (interpretado pelo ator Pierre Niney), um jovem e promissor marinheiro que é falsamente acusado de traição e condenado a prisão no temido Château d’If, uma espécie de Alcatraz, uma fortaleza sem chances de escapatória. Após anos suportando sofrimentos inimagináveis, ele consegue escapar e se reinventar como o misterioso e rico Conde de Monte Cristo. Dantès traça um minucioso e complexo plano para se vingar daqueles que o traíram. Entre seus alvos estão o seu ex- melhor amigo Fernand de Morcerf (Bastien Bouillon), o promotor corrupto Gérard de Villefort (Laurent Lafitte) e o invejoso Danglars (Patrick Mille). Cada um deles desempenhou um papel fundamental em sua queda e prisão. Mas nem só de ódio vive Dantès, o filme também explora o amor profundo dele por Mercedes (Anaïs Demoustier), sua namorada e futura esposa que seguiu em frente com sua vida após o desaparecimento de Dantès.

A produção é calcada em apuro técnico e atenção aos detalhes de época. O cinematógrafo Nicolas Bolduc não poupou esforços para nos chocar com os contrastes da vida burguesa da classe média e alta francesa do século XIX e da miséria, doença e desespero que a escuridão de pedra dos calabouços da prisão oferecia a seus internos. De uma forma geral, o filme é bastante escuro e joga com luzes e sombras o tempo todo. Dessa forma cria a tensão acompanhada pela bela trilha sonora. Os figurinos são deslumbrantes, porém fiéis, sem artifícios modernos ou exageros tonais. A ideia é mandar o público em uma viagem no tempo como expectador das intrigas e dramas pessoais de Dantès.

O jovem ator francês Pierre Niney, bastante festejado como um dos mais prósperos jovens talentos do cinema, incorpora Dantès de uma forma muito sóbria. Talvez discreta até demais para o meu gosto. Em determinados momentos cheguei a desejar que ele nos oferecesse mais com o olhar, ou com trejeitos. Talvez eu não tenha no cinema um bom parâmetro de comparação para o papel que antes já havia sido interpretado em produções de língua inglesa por Richard Chamberlain (1975) e Jim Caviezel (2002) e francesa por Gérard Depardieu (1999) ou Jean Marais (1954), mas a minha experiência pessoal com o romance de Dumas exigia, em minha fantasia, uma expressividade maior. Porém, mesmo isso não diminui o bom nível das interpretações e da qualidade acima da média dessa produção, que conseguiu – ao contrário de outros retratos de época recentes e bastante caricatos – passar uma sensação genuína de veracidade para a fantasia.

O Conde de Monte Cristo, em sua enésima adaptação, continua sendo um material que nos atrai e mexe com alguns de nossos instintos mais primitivos, como o da sobrevivência e o revanchismo. É o nosso bom e velho “reconhece a queda e não desanima, levanta, sacode a poeira e dá a volta por cima” de Paulo Vanzolin na voz de Beth Carvalho.

Tais Zago

Tem 46 anos. É gaúcha que morou quase a metade da vida na Alemanha mas retornou a Porto Alegre. Se formou em Design e fez metade do curso de Artes Plásticas na UFRGS, trabalha com TI mas é apaixonada por cinema.

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