Zuenir Ventura tem um livro lindíssimo, e cujo título eu adoro: “minhas histórias dos outros” (Objetiva, 2005). A referência é clara: o paraibano radicado no Rio de Janeiro, decano do jornalismo brasileiro, está se referindo às histórias e personagens que ele conheceu ao longo de mais de sessenta anos de jornalismo. “Uma história que começa numa faculdade de letras, entre professores como Manuel Bandeira e Alceu Amoroso Lima, continua num arquivo de jornal e, de redação em redação, vai até a Amazônia, passando por Paris, Viena e algumas vielas de favelas cariocas”, explica Zuenir.
Longe de mim comparar-me ao Zuenir Ventura. A questão aqui é outra: assim como Zuenir, eu, jornalista e historiador, compartilho deste prazer que é falar sobre histórias que são minhas, mas, ao mesmo tempo, dos outros, porque, afinal, jornalistas e historiadores/as fazem exatamente isso, ainda que guardadas as devidas particularidades de um e de outro ofício: buscam no passado e no presente, respectivamente, histórias de outras pessoas para escreverem seus textos – e ao fazerem isso, tornam-se parte dessas histórias.
Quando desenvolvi o Café História, há 15 anos, eu sabia que ele poderia me fazer ir um pouco mais além na prática de contar “as minhas histórias dos outros”. Esse passo adiante tem a ver com a “natureza” da divulgação científica e da história pública: com o Café História eu poderia divulgar não só as minhas histórias dos outros, mas também as histórias que meus colegas historiadores e historiadoras contavam dos outros.
Sinto enorme prazer em divulgar a História que os meus colegas historiadoras e historiadoras produzem dentro de seus departamentos, escolas, museus, arquivos, centros de pesquisa e programas de pós-graduação. Poucas coisas no meio acadêmico me alegram tanto quanto levar essas pesquisas, fruto de tanta dedicação, esmero e investimento (quase sempre público) a um grande número de pessoas. O divulgador científico que acumula a função de editor, como eu, conta muitas e muitas histórias suas que são de outros e outras.
Este editorial não pode ser nada além de um agradecimento. Um agradecimento a todos e todas que nesses 15 anos contribuíram, de alguma forma, direta ou indiretamente, para tornar o Café História um portal respeitado de divulgação científica e história pública. Esse agradecimento vai para as 65.000 pessoas que entre 2008 e 2016, quando o Café História era uma rede social, fizeram seus perfis e deram vida ao site com mensagens de chat, fóruns, fotos, vídeos e grupos de estudo; para os leitores que nos visitam todos os dias nesta segunda fase, a fase portal, iniciada em 2017; para todos os autores e autoras que desde a tenra infância do projeto colaboraram com ele, seja por meio de entrevistas, artigos, bibliografias comentadas ou declarações para notícias e reportagens; para as pessoas que visitam, leem e indicam os nossos conteúdos; para as pessoas de diferentes formações e atuações profissionais que seguem os perfis do Café História nas redes sociais e nos apoiam cotidianamente; para Ana Paula Tavares, Cristiane d’Ávila e Thais Pio Marques, que ajudam a tocar ideias e seções dentro do projeto; para os tantos parceiros que tivemos ao longo do tempo, desde as mais antigas parcerias, como aquela com a saudosa Revista de História da Biblioteca Nacional, até as mais recentes e em vigor, como aquelas com a Coordenação Nacional do ProfHistória e o Departamento de Arquivo e Documentação da Fundação Oswaldo Cruz. O Café História nasceu como rede social, e embora não seja mais uma rede social desde 2017, permanece tendo DNA colaborativo, porque nossa crença segue a mesma: a melhor história é aquela que se faz a muitas mãos.
Muita coisa mudou de lugar nessa década e meia. Quando o portal deu os seus primeiros passos, os blogs dominavam a internet. Hoje, o cenário mudou profundamente. Os blogs ainda estão por aí, cumprindo o seu bravíssimo papel, mas a internet tem a cara dos podcasts, dos vídeos, do WhatsApp, tem a linguagem do TikTok e do Instagram dos influenciadores. Tudo isso fez com que o Café História se adaptasse a cada transformação da web. Mudamos nossa logo, nossas cores, nossa identidade visual, nossa estrutura de navegação, nossas seções, nossa forma de escrever, incorporamos novas mídias e exploramos novos formatos – em meio a tudo isso, criamos projetos bem sucedidas e outros nem tanto, mas sempre tentando divulgar da melhor forma a nossa história dos outros.
Quando o Café História foi ao ar em 2008, havia poucas experiências em divulgação histórica na internet. “Era quase tudo mato”, gosto de dizer. Em muitos aspectos, tive que tatear no escuro a fim de construir os caminhos desse então novo trabalho de comunicação pública da história. Hoje, fico contente quando escuto pessoas dizendo que o Café História foi ou continua sendo uma inspiração para os seus trabalhos de história pública.
Não sei ao certo como comemorar 15 anos de vida do Café História, pois nunca tive um projeto que vivera por tanto tempo. Mas é preciso alguma comemoração, ainda mais porque não é nada fácil manter um projeto deste tamanho por tanto tempo. Então, que haja comemoração! Eu queria mesmo é estourar uma rolha de champanhe e brindar com cada pessoa que fez e faz parte desta história. Mas como isso não é possível, planejei uma série de ações que vão ser realizadas ao longo deste ano de 2023.
Vamos produzir conferências sobre história pública, coletar depoimentos, reproduzir conteúdos que marcaram nossa trajetória, construir listas (quem não gosta?), divulgar o alcance de nossos conteúdos, os textos que mais tiveram ressonância, disponibilizar materiais gratuitos como planners e similares. E, claro, vamos comemorar fazendo o que mais gostamos de fazer: produzindo e divulgando as nossas histórias dos outros.