Crônicas, poesias, historiografia e críticas literárias estão entre as fontes utilizadas pela historiadora Maria Aparecida Rezende Mota (UFRJ).
Por Letícia Maia e Ygor Martins [1]
De que forma podemos compreender a relação entre historiografia e literatura na formação de identidades brasileiras e lusitanas? Esta é uma das perguntas que orientam a nova pesquisa da historiadora Maria Aparecida Rezende Mota, professora do Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro e pesquisadora do Real Gabinete Português de Leitura. Intitulado “Em busca da nacionalidade: o romance e a história oitocentistas”, o estudo examina a obra de escritores e historiadores portugueses e brasileiros. O objetivo principal é compreender como as duas sociedades foram apresentadas, representadas e imaginadas nessas narrativas – historiográficas e romanescas. A pesquisa também quer entender as semelhanças e diferenças entre esses dois tipos de escrita.
A abordagem teórica adotada opera com as categorias de representação, narrativa e imaginário social, e é ancorada em perspectivas de História Intelectual, História Social da Cultura, História da Historiografia e Estudos Literários. Segundo a pesquisadora, a busca pela resposta à pergunta “Quem somos?” orientou muitas obras históricas e literárias no Ocidente do século XIX. Eram obras que se preocupavam principalmente em pensar as origens e as singularidades nacionais.
Ainda que o enfoque temporal de Mota seja os oitocentos, o trabalho recua até 1730 ao lidar com a obra “História da América Portuguesa”, de Sebastião da Rocha Pitta, e chegam até obras como “Os Maias” (1888), de Eça de Queiroz, “Canaã” (1901), de Graça Aranha, e “História da Literatura Brasileira” (1916), de José Veríssimo. Além de romances e obras historiográficas, também integram o corpus documental de Mota poesias, críticas literárias e crônicas. É o caso de “Scénes de la Nature sous les Tropiques” (1824), do viajante e historiador Jean-Ferdinand Denis, “A Confederação dos Tamoios” (1856), poema épico escrito por Domingos José Gonçalves de Magalhães, e “Lendas e Narrativas” (1851), de Alexandre Herculano. De acordo com a historiadora, a pesquisa “dirige-se às construções simbólico-discursivas da nação, uma das mais poderosas operações simbólicas por meio das quais uma coletividade se organiza e se percepciona. Essas construções se manifestam na Literatura e na História praticadas em Portugal e no Brasil oitocentistas.”
A origem da pesquisa
De acordo com Mota, a pesquisa tem origem no encontro entre seus interesses acadêmicos e pessoais. A historiadora explica que a sua paixão pela Literatura veio antes mesmo da História, desde a sua infância, e continuou na graduação, mestrado e doutorado: “A ficção literária faz com que a gente viva outras vidas! Despertando deslumbramento e prazer, desestabilização e desconforto. Tudo junto!” Enquanto isso, do lado da História, sua escolha pelo século XIX se justifica por conta das especificidades do período: “é um momento de certeza e abalo das certezas, que se manifestam no discurso historiográfico e ficcional. Um século rico, fascinante!” – sublinhou Mota.
Pesquisa que pode virar livro
“Em busca da nacionalidade: o romance e a história oitocentistas” foi iniciada em 2015 e está prevista para ser encerrada em 2018. Segundo Cida Mota – como carinhosamente é conhecida entre alunos e colegas de profissão – a pesquisa já inspirou monografias e dissertações, gerou capítulos de livro, artigos e um livro está previsto. A historiadora sublinha que o historiador precisa ler permanentemente a “boa literatura”. “Não necessariamente como objeto de pesquisa ou apenas prazer pessoal, mas para sua própria formação”. Na conversa para esta matéria, Mota também frisou a importância dos historiadores falarem para o grande público: “A gente está escrevendo para nós mesmos. Infelizmente, o historiador não tem lugar na casa do homem comum…”.
Conheça outros trabalhos da historiadora
MOTA, M. A. R. Relações culturais entre Brasil e Portugal: novas perspectivas historiográficas. História da Historiografia, v. 7, p. 318-324, 2011.
______________. A escrita da nacionalidade na Geração de 1870. O Brasil entre méritos e defeitos. Anais do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro, v. 34, p. 87-106, 2002.
______________. Ocidentalização, modernização, nação: ambigüidades de um projeto político-literário. Semear (PUCRJ), Rio de Janeiro, v. 06, p. 93-106, 2002.
______________. (Re) Inventando a nação no Brasil e em Portugal. Diálogos e impasses da Geração de 70. Convergência Lusíada, Rio de Janeiro, v. 17, p. 216-227, 2000.
[1] Alunos do curso de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro. A notícia foi produzida no âmbito da disciplina “História Pública” (2017.1), ministrada pelo professor Bruno Leal, e gentilmente cedida ao Café História pelos autores.