História da polícia e do crime no Brasil: dez obras de referência para conhecer

Frederico Oliveira, mestre em História Social (FFP-UERJ), autor da dissertação Uma História do “Esquadrão da Morte”: Mitos, símbolos, indícios e violência no Rio de Janeiro (1957-1969), indica 10 obras para uma introdução às temáticas polícia e crime no Brasil.
20 de fevereiro de 2017
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Colt---Pistola
Colt Modelo 1862 - revólver usado pela polícia de Nova York. Serial No. 38549. Foto: The Met, Gift of W. C. Foxley, 2014.

Os estudos sobre polícia e criminalidade, temáticas comuns desde a década de 1940 a sociólogos, jornalistas, policiais criminalistas, ex-detentos, escritores e antropólogos, somente a partir dos anos 1990 passaram a ter uma maior atenção dos historiadores, até então mais interessados em outros assuntos. Assim, sendo objetos ainda pouco explorados pela pesquisa historiográfica, principalmente na perspectiva do tempo presente, a polícia e o crime representam na atualidade, em face das reiteradas crises envolvendo segurança pública, uma oportunidade desafiadora para o campo da História.

BARRETO FILHO,Mello; LIMA, Hermeto. História da polícia do Rio de Janeiro. Aspectos da cidade e da vida carioca. Rio de Janeiro: A Noite. 3 volumes. [Vol. I, 1565/1831. Prefácio de Filinto Müller. 1939. 361p. Vol. II, 1831/1870. Prefácio de Felisberto Batista Teixeira. 1942. 332p. Vol. III, 1870/1889. Prefácio de Pedro Calmon. 1944. 300p.]

A obra de Mello Barreto Filho e Hermeto Lima possivelmente foi, em seu conjunto, até a data de sua publicação, entre 1939 e 1944, o trabalho mais abrangente escrito sobre a polícia da então capital federal, o Rio de Janeiro, e continua até hoje sendo obra incontornável para quem pretende se iniciar no estudo sobre a polícia carioca do século XIX.

HOLLOWAY, Thomas H. Polícia no Rio de janeiro. Repressão e resistência numa cidade do século XIX. Rio de Janeiro: FGV, 1997.

O livro, obra de renomado historiador Thomas H. Holloway, apresenta a evolução histórica da polícia do Rio de Janeiro ao longo do século XIX, procurando compreender aspectos da repressão e da resistência da sociedade da cidade num quadro mais amplo de uma transição do controle do poder através das instituições públicas, quando o poder do Estado passa a preponderar no espaço público.

CORRÊA, Valmir Batista. Coronéis e Bandidos em Mato Grosso, 1889-1943. Campo Grande: UFMS, 2006.

O livro, originalmente uma tese de doutorado de Corrêa, aborda o domínio dos coronéis sobre as comunidades locais, sua luta por poder e a ação dos bandidos daquela região, entre 1889 e 1943, procurando compreender os processos históricos que originaram o separatismo mato-grossense que posteriormente resultou no Mato Grosso do Sul.

CANCELLI, Elizabeth. O mundo da violência: a polícia na Era Vargas. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1993.

Originalmente tese de doutoramento da autora, que escreveu também A Cultura do Crime e da Lei, Carandiru: a prisão, o psiquiatra e o preso e organizou o livro História de Violência, Crime e Lei no Brasil, a obra apresenta um estudo sobre o aparato policial do Estado, a vigilância exercida pela polícia sobre a sociedade e a violência durante a denominada Era Vargas, problematizando, dentre várias questões, o ano de 1937 e os desdobramentos do projeto político estadonovista.

BRETAS, Marcos Luiz. Ordem na cidade: O exercício cotidiano da autoridade policial no Rio de Janeiro, 1907-1930. Tradução de Alberto Lopes. Rio de Janeiro: Rocco, 1997.

O livro, originalmente tese de doutorado defendida na Open University, do Reino Unido, obra de um historiador que é referência sobre as temáticas, utilizando como fonte privilegiada livros de registros de ocorrências de distritos policiais do Rio de Janeiro, entre 1907 e 1930, aborda sobretudo as relações entre a polícia e o público, além de questões como o processo de institucionalização das polícias, o Estado e sua influência no trabalho policial, o cotidiano policial na sociedade carioca, aspectos do policiamento cotidiano, a burocracia, suas rotinas, o medo da desordem e a insegurança na cidade capital.

FAUSTO, Boris. Crime e Cotidiano: a criminalidade em São Paulo (1880-1924). São Paulo: Brasiliense, 1984.

Obra do historiador veterano, autor também de Trabalho urbano e conflito social: 1890-1920 e O Crime do Restaurante Chinês: carnaval, futebol e justiça na São Paulo dos anos 30, o livro procura compreender o mundo da marginalidade, em sua especificidade, como um fenômeno social, e seus contatos com a polícia e o judiciário.

BARBOSA, Adriano. Esquadrão da Morte – Um mal necessário? Prefácio de Nélson Rodrigues. Rio de Janeiro: Mandarino, 1971.

Livro-reportagem escrito por conhecido jornalista (autor de Sacopã – Bandeira, Herzog, Delane. No túmulo da cidadania), a obra é a primeira a dar um tratamento mais jornalístico e menos ficcional ao fenômeno “esquadrão da morte”. A obra é leitura obrigatória para quem pretende pesquisar polícia e crime no Rio de Janeiro entre as décadas de 1950 e 1960.

MELLO, Frederico Pernambucano de. Guerreiros do Sol: violência e banditismo no Nordeste do Brasil. Prefácio de Gilberto Freyre. [1ª ed. 1985] São Paulo: A Girafa Editora, 2004.

Obra de historiador (autor também de Estrelas de Couro – A Estética do Cangaço), o livro questiona várias teses até então aceitas pela historiografia tradicional sobre o cangaço e sua figura mais conhecida, Lampião. É um livro fundamental para se compreender o cangaço, os costumes, as relações de poder e a violência no Nordeste daquele período.

AMORIM, Carlos. Comando Vermelho: a história secreta do crime organizado. Rio de Janeiro: Record, 1993.

Neste livro, agraciado com o Prêmio Jabuti em 1994 na categoria reportagem e primeiro de uma trilogia composta por CV – PCC: A irmandade do crime e Assalto ao poder: o crime organizado, o jornalista Carlos Amorim aborda com riqueza de detalhes a formação do Comando Vermelho no final da década de 1970 e o impacto da facção criminosa no Rio de Janeiro nas décadas seguintes.

FONTES, C. N.; FLÁVIO, S. N.; COSTA, M.; BRETAS, M. L.(Org). História das Prisões no Brasil. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 2009. 2 v.

A obra, dividida em dois volumes, reúne artigos de diversos pesquisadores e procura evidenciar o sentido histórico da prisão no Brasil, representando sua publicação uma substancial contribuição da academia para se pensar e compreender a questão do cárcere e o sistema prisional brasileiro.

Como citar esta bibliografia

OLIVEIRA, Frederico. História da polícia e do crime no Brasil: dez obras de referência para conhecer (Bibliografia Comentada). In: Café História. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/historia-da-policia-e-do-crime-no-brasil-dez-obras-de-referencia-para-conhecer/. Publicado em: 20 fev. 2017. ISSN: 2674-5917.

Frederico Oliveira

Professor, graduado em História (UERJ), mestre em História Social (FFP-UERJ) e especialista em História das Relações Internacionais (UERJ).

32 Comments Deixe um comentário

  1. Atendendo a sugestões, vamos ampliar esta lista?

    ADORNO, S. . Os Aprendizes do Poder. (O Bacharelismo Liberal Na Politica Brasileira).. 1. ed. RIO DE JANEIRO: PAZ E TERRA, 1988. 266 p

    MINGARDI, Guaracy. Tiras, gansos e trutas. São Paulo: Scritta, 1992.

    e tem muitos mais…outra hora vou adicionando.

  2. Ver também: Sepúlveda dos Santos, Myriam Os porões da República: a barbárie nas prisões da Ilha Grande 1894-1945. FAPERJ-Garamond, Rio de Janeiro, 336p.

  3. Ótimas sugestões! Há muita obra interessante para constar em listas sobre as temáticas polícia e crime. Como toda lista, a minha é pessoal, parcial, incompleta. Revela lacunas. Poucas obras de historiadores voltadas para o tempo presente. Mas, por outro lado, as próprias omissões da lista sugerem um vasto campo de estudos a espera do interesse das novas gerações de pesquisadores. Mãos à obra!

    • desde o Brasil Imperial, mim fale qual foi a instituição policial que não trabalhou para classe dominante, inclusive antes da constituição de 1988, juízes, promotores, delegados de polícia e Oficiais d policia Militar, eram todos filho de apadrinhados políticos, nenhum pobre tinha acesso a esses cargos, ou seja eram todos Biõncos.Com o advento da constituição de 1988, iniciaram-se os concursos, tirando os privilégios de apadrinhados políticos.

  4. Boa noite!
    Meu nome é Paulo Henrique, sou historiador, pesquisador em segurança pública. Mas, acreditem, minha leitura maior é no campo da sociologia.
    Estou interessado em iniciar um projeto de pesquisa que será apresentado a um programa de doutorado em História. É a análise de um movimento paredista (greve) da PM-MA ocorrido em 2010 aqui no Maranhão. Pretendo discutir as relações de poder existentes entre praças e oficiais/polícia e Estado.
    Vocês poderiam me indicar uma bibliografia historiográfica sobre o tema?

    • Caro Paulo, a dissertação e a tese da prof. Juniele Rabêlo de Almeida estão disponíveis para download. A primeira é sobre a greve de 1997 em Minas Gerass, já a tese é sobre o movimento daquele ano no Brasil. As fontes dela são documentações oficiais, jornais e relatos orais.
      Acho que o trabalho dela é fundamental para seu projeto.
      Abraços!

  5. Oi, Paulo Henrique. Sendo uma pesquisa cujo recorte temporal se dá no âmbito de uma história imediata, é compreensível a escassez de bibliografia da área sobre o assunto. Sobre algo que possa ajudar no estudo da questão posta, conheço apenas uma tese, intitulada “FORMAÇÃO DE OFICIAIS DA PMMA: uma visão paraláctica acerca da segurança pública”, de Vera Lucia Bezerra Santos, defendida em 2012 na FGV; a dissertação “Piquete na caserna? Uma reflexão acerca do direito dos militares estaduais à greve”, de Diego Nogueira, e o livro de Domingos Vieira, “A polícia Militar do Maranhão: síntese histórica”, de 1975, e “O dia em que a polícia parou: a verdadeira história da greve da polícia mineira que parou o Brasil”, de Júlio Cesar Gomes, o “Cabo Júlio”. O livro segundo a sinopse, aborda a história do movimento reivindicatório por melhores salários iniciado pelos praças da Polícia Militar, do Estado de Minas Gerais, em junho de 1997. Abraço

      • Olha: em 1971 conheci uma sociólogo fazendo o seu PhD na escola de Criminologia da U da California em Berkeley: o Homero Yearwood. A sua área de trabalho era a California e o Brasil, aonde passou ceca de um ano e meio (em Belo Horizonte). Se v quiser uma visão fora dos esquadros nacionais aqueles baseados no Direito, essas coisas que a gente está careca de saber em geral pela metade, procure-o. Deve estar num dos State Colleges daquele estado, (talvez em Sacramento State College) mas não sei ao certo se ainda não se aposentou. Fala bem espanhol e não vai ter problemas de comunicação; se quiser cite o meu nome (Geraldo Franco de Santa Barbara e Rio de Janeiro). Deve ter muita coisa publicada que não sei pois nos separamos em 1972. E a Escola de Criminologia fechou com as maluquices do Reagan, aquele governador que virou coisa pior e que então acabou com muita coisa daquele estado.

        • No campo da sociologia e do Direito eu até que me desenrolo.
          O problema está na historiografia. Embora, eu seja historiador. O Depto é chatão com isso.

  6. Olá gente. Sou graduando em História pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Pretendo pesquisar sobre o racismo nas primeiras décadas do século XX no Rio de Janeiro. Meu objeto de pesquisa será o Clube de Regatas Vasco da Gama, por ter sido o primeiro clube no Rio a aceitar negros e mulatos no futebol carioca (e no Brasil?). Sendo assim, é necessário uma bibliografia sobre temas que abordem a situação do negro no Rio nas primeiras décadas do século XX. Pelo recorte espacial e temporal que eu pretendo pesquisar, e com base nos títulos, o Frederico já me ajudou com uma referência: “BRETAS, Marcos Luiz. Ordem na cidade: O exercício cotidiano da autoridade policial no Rio de Janeiro, 1907-1930. Tradução de Alberto Lopes. Rio de Janeiro: Rocco, 1997”. O Rafael Nogueira também me ajudou com essa: “SALEM, Marcos David. História da polícia no Rio de Janeiro, 1808-1930: uma instituição a serviço das classes dominantes”. Se alguém mais puder me ajudar com bibliografia referente ao futebol carioca, e/ou a situação dos negros (nos casos acima, como refere-se a polícia, talvez há um enfoque sob determinada relação entre a instituição e os negros) neste período, eu agradeço!

  7. Como pesquisador e historiador, acredito que também poderia integrar essa lista o livro Um Certo Delegado de Capturas – O Romance de um Mito-Heroi, escrito e publicado no ano de 2009 pelo Coronel Klinger Sobreira de Almeida, do Quadro de Oficiais da Reserva da Polícia Militar de Minas Gerais. O livro narra a saga de um policial mineiro, Pedro Ferreira dos Santos, cuja atuação em meio à bandidagem dos anos 50 a 60, constitui grande referência no que se refere às estratégias de investigação e captura policial.

  8. Obra que poderia ter sido relacionada… “O medo na cidade do Rio de Janeiro: dois tempos de uma história”, de Vera Malaguti, com prefácio de Loïc Wacquant. O livro investiga “a difusão do medo do caos e da desordem para neutralizar e disciplinar as massas empobrecidas, a partir da hegemonia conservadora. Para entender as bases do medo contemporâneo, a autora analisa os discursos sobre a segurança na conjuntura de pânico no Rio de Janeiro na década de 1990 do século XX, paralelo ao estudo dos medos cariocas do século XIX, ao retratar a repercussão no Rio de Janeiro da revolta muçulmana escrava conhecida como a Revolta dos Malês.” A autora procura ressaltar “as rupturas e permanências em relação aos medos de hoje. Seu estudo contribui não só para a historiografia do controle social no Rio de Janeiro, mas para três outras áreas diferentes da investigação social.” A autora, Vera Malaguti Batista, é mestre em História Social, doutora em Saúde Coletiva, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e secretária-geral do Instituto Carioca de Criminologia.

  9. Gian Carlo de Melo Silva, organizou em 2015 “Os Crimes e a História do Brasil: Abordagens possíveis.” A obra conta com artigos escritos pelos pesquisadores Luiz Mott, Francisco Linhares Fonteles, Mary Del Priori, Anna Vasconcelos Ottoni, Célia Nonata da Silva, Marilene Antunes Sant’Anna, entre outros. O organizador, Gian Carlo de Melo Silva, é doutor em história e professor da Universidade Federal de Alagoas. A obra permite conhecer um pouco mais a produção acadêmica recente sobre a temática.

    • Esse eu não relacionei aqui, mas é uma obra importante, certamente, o relato de uma experiência de campo, escrito por expoente dos estudos sobre segurança pública e cidadania no Brasil. Boa dica, José!

  10. No grupo “História da Polícia e da Criminalidade”, no Facebook, disponibilizo mais dicas de livros, pesquisas e eventos voltados para as referidas temáticas. Há muita bibliografia para ser explorada, divulgada, conhecida. Deem um pulinho até lá para conhecer!

  11. Um livro pouco citado mas que se insere num nicho de obras sobre a temática escrita por delegados, agentes públicos, policiais, etc, é o “Punidos e mal pagos: violência, justiça, segurança pública e direitos humanos no Brasil de hoje”, do Nilo Batista. Diz a sinopse:”No presente livro, Nilo Batista – renomado professor de Direito Penal e advogado com larga experiência – empreende a discussão daqueles temas a partir de episódios e conjunturas reais, colocando à disposição do leitor informações importantes sobre as variáveis jurídicas e sócio criminológicas que orientam seu enfoque. São artigos inicialmente endereçados ao chamado público não especializado, que, entretanto, não renunciam a um nível acadêmico que torna sua leitura indicada igualmente para estudantes, professores e profissionais da justiça criminal. Com sua indiscutível autoridade, Nilo Batista põe o dedo nas feridas mais abertas do sistema penal e convida o leitor a refletir sobre as funções ocultas de certas desgastadas soluções usuais.” O autor, Nilo Batista, é advogado e professor de direito penal, ex-governador do Estado do Rio de Janeiro e ex-Secretário de Justiça e Polícia Civil do Rio de Janeiro. O título é ótimo.

  12. Cid Benjamin escreveu sobre o polêmico delegado Helio Luz, no livro “Helio Luz: Um xerife de esquerda”. O livro é de 1998. Como se lê na sinopse da obra, para a elaboração do livro o autor “recolheu longos depoimentos do próprio Hélio e de outros policiais para fazer um livro que retrata a trajetória desse delegado singular e debate um dos temas – o da segurança – mais importantes para a nossa sociedade atual.”

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