Exposição examina história e memória de uma das mais importantes instituições psiquiátricas brasileiras

25 de maio de 2017
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“Mais que humanos. Arte no Juquery”, em cartaz no Arquivo Público do Estado de São Paulo, foca no Hospital Psiquiátrico do Juquery.

Por Bruno Leal | Agência Café História

O Arquivo Público do Estado de São Paulo (APESP) inaugura nesta quinta-feira, 25 de maio, a exposição “Mais que humanos. Arte no Juquery”, que disponibiliza ao grande público documentos que fazem parte da história e da memória do Hospital Psiquiátrico do Juquery, uma das mais antigas e maiores colônias psiquiátricas do Brasil, localizada em Franco da Rocha, região metropolitana de São Paulo. Trata-se de uma versão nova e ampliada da mostra realizada pelo Museu de Saúde Pública Emílio Ribas – Instituto Butantan (IB) em 2016 e estará disponível para visitação até 23 de junho de 2017.

Selecionando documentos
Equipe do APESP selecionando prontuários. Foto: APESP.

O diferencial desta nova exposição é a apresentação inédita de 18 prontuários médicos de internos do Sanatório Pinel (1930-1944) e do antigo Manicômio Judiciário do Juquery (1897-1925), acervo sob custódia do APESP, completando a seleção de obras de artes plásticas produzidas pelos próprios internos do Juquery, na década de 1950.

Psiquiatra inovador

As esculturas em argila e pinturas que fazem parte da exposição foram selecionadas pelo curador Ricardo Resende. Todo as obras foram produzidas por internos “com vocação artística” do antigo Hospital Psiquiátrico de Juquery, realizadas no “Ateliê Livre”, implantado pelo paraibano Dr. Osório César (1895-1979), em 1952, quando torna-se o responsável pela seção nomeada de Escola Livre de Artes Plásticas do Juquery. César foi um dos principais psiquiatras brasileiros do século XX e, ao lado de Nise da Silveira, um dos pioneiros no uso da arte como recurso terapêutico. Ele trabalhou com discípulos de Carl Gustav Jung e manteve correspondência com Sigmund Freud. Atuou por mais de quatro décadas no Hospital Psiquiátrico do Juquery. Marcelo Antonio Chaves, diretor do Centro de Difusão e Apoio à Pesquisa do Arquivo Público do Estado, setor do APESP responsável pela organização da exposição, explica a importância do trabalho do psiquiatra:

– O Dr. Osório Cesar entendia o trabalho de manufatura como uma laborterapia. Ele entendia que o trabalho manual era muito importante para o tratamento, principalmente para a expressão de sentimentos desses pacientes. Além disso, o conjunto de obras representa um panorama da saúde mental dos internos. Além do valor estético, essas obras podem ser fontes de pesquisa para várias áreas.

Discurso eugênico

Quanto ao acervo de prontuários sob custódia do APESP, Chaves destaca a importância do acervo de prontuários do Sanatório Pinel (ao todo, quatro mil prontuários) e do Manicômio Judicial do Juquery (três mil prontuários), sob custódia do Arquivo Público:

– Esta série documental mostra como a psiquiatria brasileira da época concebia a doença mental, a partir de um discurso eugenista, implantado desde a década de 1920 por Pacheco e Silva, diretor do Juquery. Os prontuários também mostram particularidades quanto à saúde e comportamento dos pacientes. A exposição mostrará também alguns tipos documentais que compõem um prontuário, por exemplo, os depoimentos de familiares dos internos. Esta é uma documentação muito rica para pesquisadores das áreas de antropologia, sociologia e história, entre outras.

Exposição de trabalhos dos internos
Trabalhos dos antigos internos na exposição. Foto: APESP

“Mais que humanos. Arte no Juquery” traz luz para a história desses internos, que foram retirados do convívio social e encontraram nessa iniciativa uma forma de expressão de suas dores e inquietações no confinamento. Os 18 prontuários expostos preservarão a identidade dos pacientes, mas possibilitarão ao visitante conhecer o perfil dos daqueles que passaram pelo Sanatório Pinel e pelo Manicômio do Juquery. Dois desses prontuários, um de cada instituição, serão mais detalhados e permitirão ao visitante conhecer os diferentes itens documentais que os compõem.

Serviço e “para saber mais”

A exposição é resultado resultam de uma parceria do APESP com o Museu de Saúde Pública Emílio Ribas – Instituto Butantan (IB), o Museu Osório César – Complexo Hospitalar do Juquery e o Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). O Arquivo está localizado na Rua voluntários da Pátria, 596 – Santana (ao lado do metrô Tietê). Funciona de 2ª a 6ª feira, das 10h00 às 16h30 (exceto feriados), com entrada gratuita. Para saber mais sobre o tema, indicamos dois trabalhos. O primeiro é a dissertação de mestrado “O Junquery: sua implementação, projeto arquitetônico e diretrizes para uma nova intervenção”, de autoria de Pier Paolo Bertuzzi Pizzolato, da Universidade de São Paulo; o segundo é o artigo “A ‘Psicologia da Arte’ no Olhar de Osório Cesar: leituras e escritos”, do historiador Arley Andriolo.

Com informações do Arquivo Público do Estado de São Paulo – APESP

Bruno Leal

Fundador e editor do Café História. É professor adjunto de História Contemporânea do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). Doutor em História Social. Tem pós-doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pesquisa História Pública, História Digital e Divulgação Científica. Também desenvolve pesquisas sobre crimes nazistas e justiça no pós-guerra.

3 Comments Deixe um comentário

  1. Olá! Precisaria muito de um contato de e-mail
    Oficial para tentar conseguir acesso ao pronunciaria de um familiar que foi internado na ala feminina na década de 1960/1970. É muito importante! Servirá para ter real informação sobre o que, de fato, se passou na época. Agradeço qualquer ajuda!

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