Uma tese de doutorado recém-defendida investiga a formação das primeiras instituições policiais no Brasil, analisando como o conceito de policiamento evoluiu ao longo do século XIX. A tese, intitulada Da Guarda Real da Polícia ao Corpo de Permanentes: entre permanências e rupturas, um estudo acerca da atividade policial carioca (1809 – 1866), foi defendida em 2024 por André Luis Cardoso Azoubel Zull no Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio), sob a orientação de Cândido Gonçalo Rocha Gonçalves e coorientação de Icléia Thiesen. Leia aqui o trabalho.
O estudo examina a implantação da primeira estrutura policial no Brasil, que surgiu no contexto da transferência da Corte portuguesa para o Rio de Janeiro, em 1808. A criação da Intendência Geral da Polícia e da Guarda Real da Polícia ocorreu num modelo do Antigo Regime, em que a polícia era vista de forma ampla, englobando não apenas segurança, mas também administração da população e do território.
Ao longo do século XIX, o conceito de policiamento foi sendo transformado em resposta às mudanças políticas e institucionais do país. Com base na análise de discursos parlamentares e documentos oficiais, como avisos, ofícios e relatórios, a pesquisa demonstra como essas mudanças refletiram a transição entre diferentes grupos políticos dominantes.
Secretaria de Polícia e pelo Corpo de Permanente
A investigação também detalha a substituição da Intendência e da Guarda Real, na década de 1830, pela Secretaria de Polícia e pelo Corpo de Permanentes, acompanhando a transição para uma visão mais moderna da polícia como responsável pela ordem pública. A análise do cotidiano desses corpos policiais permite entender como suas funções e atribuições foram se modificando ao longo do tempo.
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Dividida em três capítulos, a pesquisa aborda desde a transferência da Corte portuguesa e suas implicações para a polícia do Rio de Janeiro, até os debates parlamentares sobre segurança entre 1841 e 1857. O trabalho busca revelar as permanências e rupturas na estrutura policial carioca, destacando sua evolução dentro do processo de formação do Estado brasileiro.
Segurança Pública no Brasil
O estudo de Azoubel Zull contribui para a compreensão da história da segurança pública no Brasil e do papel das forças policiais na consolidação do Estado nacional. Seu trabalho reforça ainda a importância de se compreender a história institucional da polícia como um elemento fundamental para entender os desafios contemporâneos da segurança pública no país.
O processo de desenvolvimento da polícia no Brasil e, mais especificamente, no Rio de Janeiro, tem suas bases antes mesmo da criação das primeiras instituições policiais na América Portuguesa. No século XVIII, a Europa passou por um processo de centralização e racionalização dos Estados, influenciado por ideias cameralistas germânicas, a polícia francesa e a aritmética política inglesa. Essas influências chegaram a Portugal, especialmente através das reformas promovidas pelo Marquês de Pombal.
A criação do cargo de intendente geral da polícia em 1760 e sua ampliação em 1780 demonstram uma preocupação com a burocratização e a produção de informações sobre o reino e sua população. Com a chegada da Corte ao Rio de Janeiro, o modelo policial português foi adaptado ao novo contexto colonial, resultando na criação da Intendência Geral da Polícia e da Guarda Real da Polícia. Estas instituições, inicialmente voltadas para a manutenção da ordem e da segurança pública, expandiram suas funções, abrangendo desde o controle da população até a fiscalização de impostos e obras públicas.
A pesquisa de Zull evidencia como a flexibilidade dessas instituições foi essencial para a administração da nova sede do Império Português e como suas atribuições evoluíram ao longo do tempo, moldando a estrutura da polícia brasileira no século XIX.