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Daisy Jones and The Six – Uma maravilhosa banda que nunca existiu

Daisy Jones and The Six – Uma maravilhosa banda que nunca existiu 1

A partir da esquerda: Josh Whitehouse, Sebastian Chacon, Sam Claflin, Riley Keough, Will Harrison e Suki Waterhouse LACEY TERRELL/PRIME VIDEO.

Histórias de bandas fictícias/montadas por um casting em forma (ou não) de mockumentary – suposto documentário ficcional cheio de fatos falsos e/ou deboche – ou narradas em voice over por jornalistas e integrantes, não é, de forma alguma, novidade no universo cinematográfico. Iniciou como formato musical com o fake documentário A Hard Day’s Night (1964) dos Beatles, que acabou inspirando o surgimento de The Monkees nos anos 60 e ganhou força no final da década com musicais como Tommy (1969) da banda (real) The Who, passando por Spinal Tap (1984) e ganhando nova força nos anos 1990-2000 com obras mais dramáticas como Velvet Goldmine (1998), Almost Famous (2000), Hedwig and the Angry Inch (2001) ou Dreamgirls (2006), para citar apenas alguns. A lista do estilo, portanto, é imensa, o que nos leva à pergunta – Qual história ainda não foi contada?

A resposta é simples: nenhuma. Chegamos a um ponto onde arcos e enredos como pano de fundo de empreitadas musicais já se esgotaram. Adentramos, portanto, uma nova época. Uma época em que o importante não é mais a repetições de dramas, conflitos e situações engraçadas, mas sim o trabalho estético, o esmero dos atores e a riqueza dos diálogos. Assim chegamos na série que estreou em marco no canal de streaming Amazon Prime Daisy Jones And The Six. O bestseller homônimo de 2019 da escritora Taylor Jenkins Reid, conta, em formato de entrevista com os envolvidos e membros da banda, as desavenças e os conflitos de mais um combo movido a sexo, drogas, soft rock e muito drama. Reid admitiu abertamente em entrevistas que a banda que a inspirou para o esqueleto do livro foi a mundialmente famosa Fleetwood Mac. Nos anos 70 o grupo subiu à apoteose musical ao vender mais de 40 milhões de cópias de seu álbum Rumours (1977) por todo o mundo, o 6º álbum mais vendido nos anos 70 e o 12º mais vendido de todos os tempos. Aos mitos e “rumores” envolvendo as conturbadas gravações do disco, viraram parte do folclore musical mundial. Fleetwood Mac acabou se tornou sinônimo do estilo de vida rock and roll abastecido com entorpecentes, sofrimento e loucura. Os integrantes trabalhavam suas diferenças, amores e decepções em suas músicas e o mundo assistia mesmerizado enquanto derramavam o conteúdo intenso de seus corações no palco em apresentações inesquecíveis até hoje.

Após ler o livro pensei – Tudo bem, trata-se aqui de mais um apanhado de clichês onde frontman e a frontwoman carregam a banda nas costas com sua relação conturbada. Pensei na hora, claro, em Stevie Nicks e Lindsey Buckingham, em Agnetha e Björn, Benny e Anni-Frid do Abba, e em Ike e Tina, ou qualquer outro casal que trouxe a público suas desavenças e dores afetivas. Mas também vi o potencial cinematográfico de um enredo que sempre vai encontrar um nicho – a magia da liberdade conquistada nos anos 70, a transgressão de valores conservadores, a atmosfera envolvente dos tempos pré e pós-hippie, um casal de protagonistas lindos, talentosos e extremamente carismáticos vivendo um amor torturado e nunca satisfatoriamente consumado. Era apenas uma questão de tempo até uma adaptação para as telas ou telonas ser feita.

Os criadores Scott Neustadter e Michael H. Weber não perderam tempo, adaptaram o livro de Reid e chamaram James Ponsoldt (Master Of None) e Nzingha Stewart (Little Fires Everywhere) para assumir a direção da maioria dos 10 episódios totais da série, que, adequadamente, recebem o título de tracks 1 a 10. Para o elenco, buscaram atores que sabiam tocar instrumentos e cantar, e, sim, isso faz uma diferença enorme quando assistimos qualquer tipo de biopic (mesmo que fake) de algum artista musical. E aqui a escolha foi mais que acertada. Para o papel de Daisy foi escolhida Riley Keough. A atriz incorpora o papel de uma forma mesmerizante, traz profundidade, complexidade e uma intensidade maior do que a Daisy do livro de Reid nos apresenta. O seu “par romântico” Billy é interpretado pelo sensacional Sam Claflin, que também não nos deixa nada a desejar ao nos mostrar um Billy contraditório – por vezes estrito e sisudo e em outras, completamente entregue à sua paixão pela música. A química entre os dois atores é inegável e palpável. É ela a forca motriz por trás de todos os episódios da série. É um clássico embate de egos e um vai-e-vem de sedução e tortura emocional que nos mantém vidrados todas às vezes que aparecem em cena. Uma queda de braço entre os opostos que se atraem irresistivelmente e que precisam desesperadamente um do outros para trazer a flor da pela genialidade das composições e interpretações da banda. Perto deles, compreensivelmente, o resto do elenco meio que desaparecer, apesar de suas interpretações também serem bem fortes. Em papéis coadjuvantes temos

Suki Waterhouse como a tecladista Karen que, em certo momento, forma um par romântico com o irmão de Billy, o guitarrista Graham interpretado por Will Harrison. Também uma apologia ao outro casal polêmico da banda Fleetwood Mac –

John e Christine McVie. Nabiyah Be merece uma menção honrosa pelo papel de Simone Jackson, a melhor amiga de Daisy, um dancing queen da era Disco, e suporte emocional da cantora. Apesar de seu personagem não aparecer em vários capítulos, Timothy Olyphant está sensacional como Rod Reyes, tour manager da trupe, assim como Tom Wright que interpreta Teddy Price, produtor dos The Six e figura paterna de Billy.

O elenco, que já tinha uma certa experiencia musical, passou por uma preparação para os papéis que durou um ano inteiro, ao final do qual se apresentaram para os executivos da série. O resultado superou em muito o esperado – Daisy Jones And The Six realmente se tornou uma banda real. E isso é o ponto alto de uma produção que não nos traz muitas surpresas em suas reviravoltas. O caminho de ascensão-queda-autorreflexão da banda só se torna mais verossímil ao percebemos que nada ali foi dublado e nem fingido. Os sentimentos irradiados nas performances são os sentimentos reais dos atores, seus movimentos e seus trejeitos. Cada um criou sua persona no palco, e isso funcionou espetacularmente, onde poderia ser apenas mediano sem o empenho admirável do elenco. Daisy Jones And The Six completa com louvor a tarefa de mimetizar a realidade ao misturar sentimentos reais e ficção de uma forma envolvente e convincente em quase todos os episódios. As falhas e os pontos fracos do roteiro quase somem diante de tanto talento jovem. Um roteiro mais criativo e menos apegado às situações comuns que habitam o inconsciente coletivo de todo fã de (soft) rock, teria resultado em uma verdadeira obra-prima. Mas sejamos honestos, apesar do grande hype em torno do livro adaptado, a trama é bastante previsível e com desdobramentos bastante pueris que acabam prejudicando o resultado. Mesmo assim, ainda somos servidos um grande banquete para os olhos e para os ouvidos que volta e meia ainda divagam sobre os loucos anos 70 e a exploração dos limites da liberdade.

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