Examinando o conflito árabe-israelense: uma bibliografia comentada

Leonel Caraciki, historiador da Ben Gurion University of the Negev, analisa 10 obras que discutem um dos principais conflitos da História Contemporânea.
22 de julho de 2014
Examinando o conflito árabe-israelense: uma bibliografia comentada 1

Com a recente escalada de violência entre o Hamas e Israel, é importante ficar a par do conflito. Todavia, a leitura de notícias de jornal e blogs, ainda que bem-vinda, dificilmente conseguiria dar conta dos mais de sessenta anos de conflito entre palestinos e israelenses. Por isso, a convite do Café História, decidi elaborar uma pequena lista de obras importantes para começar a entender o conflito árabe-israelense. Infelizmente o mercado editorial brasileiro não é muito forte nesta área, então a maioria das obras está em inglês.

“A Muralha de Ferro: Israel e o Mundo Árabe”, de Avi Shlaim, e “Righteous Victims: A History of the Zionist-Arab Conflict (1881-2001)”, de Benny Morris

Livros do estilo “história completa” no geral pecam por excesso de generalizações e análises pouco profundas. Mas, quando bem escritos, são incontornáveis. Os livros de Avi Shlaim e Benny Morris são os mais completos sobre o tema e acessíveis para o público. Avi Shlaim se debruça mais sobre as relações internacionais de Israel e Morris privilegia os dilemas entre israelenses e palestinos. Ambos se complementam, até mesmo nas suas visões políticas – ambos os autores são parte do fenômeno conhecido como “nova historiografia” israelense, uma tendência historiográfica que desde os anos 1980 procura desmontar a “história oficial” do Estado de Israel. Avi Shlaim enfatiza a ideia que os governos israelenses deliberadamente evitam fazer a paz com os palestinos e o mundo árabe. Benny Morris, por sua vez, acredita que existe uma predisposição dos palestinos de rejeitar a paz, pois supostamente pretende o desmantelamento do Estado de Israel.

“Israel’s Occupation”, de Neve Gordon, e “Hollow Land: Israel’s Architecture of Occupation”, de Eyal Weizman

As duas melhores obras para se entender como chegamos no momento atual da relação entre Israel e os palestinos. As análises dos autores cobrem a história da ocupação israelense em Gaza e Cisjordânia, mesclando com a análise sociológica de Gordon e a mistura de arquitetura e antropologia de Eyal Weizman, num livro que é intelectualmente riquíssimo e provocante. No livro de Weizman, destaque para os capítulos 7 – “Urban Warfare” e 9 – “Target Assassinations”. Pelo nível de dificuldade, é aconselhável que o leitor já tenha alguma familiaridade com o tema.

“A Questão da Palestina”, de Edward Said

Autor do clássico “Orientalismo”, o crítico literário Edward Said escreveu “A Questão da Palestina” em 1979, logo após os acordos de Camp David. Uma obra de reflexão política de um intelectual engajado na questão Palestina, o livro permanece atual e polêmico.

“The Palestinian Hamas”, de Shaul Mishal e Avraham Sela

A obra mais completa sobre o Hamas. O livro analisa as dinâmicas internas do movimento, focando nas suas contradições ideológicas e nas suas estratégias para gerenciar o conflito com Israel. Os pesquisadores focam boa parte do livro no ramo de caridade e trabalho social que o movimento opera em Gaza, um ponto geralmente ignorado pelos analistas e que ajuda a entender como o grupo se mantêm no poder.

“The Palestinian People” de Joel Migdal e Baruch Kimmerling, e “Palestinian Identity”, de Rashidi Khalidi

Poucas obras captam a história do povo palestino de maneira tão rica quanto essas duas obras. Baruch Kimmerling foi um sociólogo israelense de altíssimo nível e o livro é uma de suas melhores obras. O livro de Khalidi avança uma polêmica tese de que o nacionalismo palestino se inicia ainda no século XIX, contrariando muitos trabalhos que situam sua gênese no pós-Primeira Guerra Mundial ou mesmo após o êxodo de 1948. Ambos são importantíssimos e devem figurar em qualquer bibliografia.

“The Birth of the Palestinian Refugee Problem”, de Benny Morris

Um clássico que redefiniu a interpretação do conflito. Entender a questão atual sem ler sobre o êxodo que a Guerra de 1948 gerou entre a população Palestina é impossível. O livro de Morris foi escrito em 1988 e é referência até hoje, tendo também uma versão expandida intitulada “The Birth of the Palestinian Refugee Problem Revisited”. Esta última é mais fácil de encontrar em livrarias.

“Contra o Fanatismo”, de Amós Oz

Ao fim de uma lista repleta de obras que pintam um cenário desolador para o fim do conflito, certamente o leitor precisa de um alento. Contra o Fanatismo reúne palestras do escritor israelense Amós Oz, conhecido por sua militância pacifista. A mensagem honesta e clara está presente em todas as páginas e inspira a utopia de uma paz possível entre os povos.

Para não ler: qualquer livro de Ilan Pappé ou Shlomo Sand

Infelizmente, como em todos os campos intelectuais, no conflito árabe-israelense também temos autores que não merecem ser lidos. Os livros de Ilan Pappé e Shlomo Sand são repletos de distorções de documentos e interpretações pouco honestas sobre o conflito, sendo pouco recomendados. Por alguma razão possuem tradução para o português, apesar do consenso de que são obras ruins. O livro “A Limpeza Étnica da Palestina” de Pappé é repleto de erros factuais e de distorções documentais, sendo um estudo de caso de como não escrever um livro sobre o assunto. Shlomo Sand por sua vez tem pouco compromisso com um trabalho sério e prefere produzir panfletos.

Como citar essa Bibliografia Comentada

CARACIKI, Leonel. Examinando o conflito árabe-israelense: uma bibliografia comentada. In: Café História. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/conflito-arabe-israelense/. Publicado em: 22 jun. 2014.

Leonel Caraciki

Graduado em História pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (2010). É mestre em História no Programa de História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro e atualmente cursa Doutorado em Estudos sobre Israel e Sionismo na Ben Gurion University of the Negev.

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