Com a recente escalada de violência entre o Hamas e Israel, é importante ficar a par do conflito. Todavia, a leitura de notícias de jornal e blogs, ainda que bem-vinda, dificilmente conseguiria dar conta dos mais de sessenta anos de conflito entre palestinos e israelenses. Por isso, a convite do Café História, decidi elaborar uma pequena lista de obras importantes para começar a entender o conflito árabe-israelense. Infelizmente o mercado editorial brasileiro não é muito forte nesta área, então a maioria das obras está em inglês.
“A Muralha de Ferro: Israel e o Mundo Árabe”, de Avi Shlaim, e “Righteous Victims: A History of the Zionist-Arab Conflict (1881-2001)”, de Benny Morris
Livros do estilo “história completa” no geral pecam por excesso de generalizações e análises pouco profundas. Mas, quando bem escritos, são incontornáveis. Os livros de Avi Shlaim e Benny Morris são os mais completos sobre o tema e acessíveis para o público. Avi Shlaim se debruça mais sobre as relações internacionais de Israel e Morris privilegia os dilemas entre israelenses e palestinos. Ambos se complementam, até mesmo nas suas visões políticas – ambos os autores são parte do fenômeno conhecido como “nova historiografia” israelense, uma tendência historiográfica que desde os anos 1980 procura desmontar a “história oficial” do Estado de Israel. Avi Shlaim enfatiza a ideia que os governos israelenses deliberadamente evitam fazer a paz com os palestinos e o mundo árabe. Benny Morris, por sua vez, acredita que existe uma predisposição dos palestinos de rejeitar a paz, pois supostamente pretende o desmantelamento do Estado de Israel.
“Israel’s Occupation”, de Neve Gordon, e “Hollow Land: Israel’s Architecture of Occupation”, de Eyal Weizman
As duas melhores obras para se entender como chegamos no momento atual da relação entre Israel e os palestinos. As análises dos autores cobrem a história da ocupação israelense em Gaza e Cisjordânia, mesclando com a análise sociológica de Gordon e a mistura de arquitetura e antropologia de Eyal Weizman, num livro que é intelectualmente riquíssimo e provocante. No livro de Weizman, destaque para os capítulos 7 – “Urban Warfare” e 9 – “Target Assassinations”. Pelo nível de dificuldade, é aconselhável que o leitor já tenha alguma familiaridade com o tema.
“A Questão da Palestina”, de Edward Said
Autor do clássico “Orientalismo”, o crítico literário Edward Said escreveu “A Questão da Palestina” em 1979, logo após os acordos de Camp David. Uma obra de reflexão política de um intelectual engajado na questão Palestina, o livro permanece atual e polêmico.
“The Palestinian Hamas”, de Shaul Mishal e Avraham Sela
A obra mais completa sobre o Hamas. O livro analisa as dinâmicas internas do movimento, focando nas suas contradições ideológicas e nas suas estratégias para gerenciar o conflito com Israel. Os pesquisadores focam boa parte do livro no ramo de caridade e trabalho social que o movimento opera em Gaza, um ponto geralmente ignorado pelos analistas e que ajuda a entender como o grupo se mantêm no poder.
“The Palestinian People” de Joel Migdal e Baruch Kimmerling, e “Palestinian Identity”, de Rashidi Khalidi
Poucas obras captam a história do povo palestino de maneira tão rica quanto essas duas obras. Baruch Kimmerling foi um sociólogo israelense de altíssimo nível e o livro é uma de suas melhores obras. O livro de Khalidi avança uma polêmica tese de que o nacionalismo palestino se inicia ainda no século XIX, contrariando muitos trabalhos que situam sua gênese no pós-Primeira Guerra Mundial ou mesmo após o êxodo de 1948. Ambos são importantíssimos e devem figurar em qualquer bibliografia.
“The Birth of the Palestinian Refugee Problem”, de Benny Morris
Um clássico que redefiniu a interpretação do conflito. Entender a questão atual sem ler sobre o êxodo que a Guerra de 1948 gerou entre a população Palestina é impossível. O livro de Morris foi escrito em 1988 e é referência até hoje, tendo também uma versão expandida intitulada “The Birth of the Palestinian Refugee Problem Revisited”. Esta última é mais fácil de encontrar em livrarias.
“Contra o Fanatismo”, de Amós Oz
Ao fim de uma lista repleta de obras que pintam um cenário desolador para o fim do conflito, certamente o leitor precisa de um alento. Contra o Fanatismo reúne palestras do escritor israelense Amós Oz, conhecido por sua militância pacifista. A mensagem honesta e clara está presente em todas as páginas e inspira a utopia de uma paz possível entre os povos.
Para não ler: qualquer livro de Ilan Pappé ou Shlomo Sand
Infelizmente, como em todos os campos intelectuais, no conflito árabe-israelense também temos autores que não merecem ser lidos. Os livros de Ilan Pappé e Shlomo Sand são repletos de distorções de documentos e interpretações pouco honestas sobre o conflito, sendo pouco recomendados. Por alguma razão possuem tradução para o português, apesar do consenso de que são obras ruins. O livro “A Limpeza Étnica da Palestina” de Pappé é repleto de erros factuais e de distorções documentais, sendo um estudo de caso de como não escrever um livro sobre o assunto. Shlomo Sand por sua vez tem pouco compromisso com um trabalho sério e prefere produzir panfletos.
Como citar essa Bibliografia Comentada
CARACIKI, Leonel. Examinando o conflito árabe-israelense: uma bibliografia comentada. In: Café História. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/conflito-arabe-israelense/. Publicado em: 22 jun. 2014.
“Para não ler”. Curioso ver na relação tal sugestões. Até compreendo que há obras feitas intencionalmente para desinformar, subverter, confundir, deturpar, mas… como saber quais e a quem cabe decidir isso? Tendo a aceitar que todo livro ruim ou não pode ser lido. Sabemos que as opiniões quanto a obras podem mudar com o tempo. Me chamou a atenção a observação.
Frederico Oliveira, Ilan Pappé e Shlomo Sand são ótimos autores! Considero um atrevimento e pouca honestidade cientifica do professor Leonel Caraciki, recomendar a não leitura sobre esses autores tão considerados no mundo, dos quais já li algumas obras.
Aliás, no dia 24 de abril, amanhã, o historiador Ilan Pappé estará no Teatro Tucarema, (Perdizes, em São Paulo) divulgando e debatendo seu livro “A Limpeza Étnica na Palestina”, onde ele defende o uso do “paradigma da limpeza étnica” ao invés do “paradigma da guerra”. Pois, o conflito israeliano-palestino, não é uma guerra, é uma invasão/ocupação do território e uso de violência desmedida e sem fim contra o povo palestino, numa tentativa da parte de Israel, de dizimar aquele povo.
Assim, mais do que honesto, Ilan Pappé coloca os pingos nos is da história.
Atenciosamente
Também me incomodou, Maria, a sugestão de não leitura, principalmente vindo de um pesquisador.
Frederico Oliveira, Ilan Pappé e Shlomo Sand são ótimos autores! Considero um atrevimento e pouca honestidade cientifica do professor Leonel Caraciki, recomendar a não leitura sobre esses autores tão considerados no mundo, dos quais já li algumas obras.
Aliás, no dia 24 de abril, amanhã, o historiador Ilan Pappé estará no Teatro Tucarema, (Perdizes, em São Paulo) divulgando e debatendo seu livro “A Limpeza Étnica na Palestina”, onde ele defende o uso do “paradigma da limpeza étnica” ao invés do “paradigma da guerra”. Pois, o conflito israeliano-palestino, não é uma guerra, é uma invasão/ocupação do território e uso de violência desmedida e sem fim contra o povo palestino, numa tentativa da parte de Israel, de dizimar aquele povo.
Assim, mais do que honesto, Ilan Pappé coloca os pingos nos is da história.
Atenciosamente
Pensei exatamente assim. Vislumbrei DISCRIMINAÇÃO.
Engraçado que o livro de Sand foi elogiago pelo finado Eric Hobsbawn…
E por Tony judt também
É muita petulância, pra dizer o mínimo, afirmar que não se deve ler “qualquer livro de Ilan Pappé ou Shlomo Sand”! Autores desse peso e consideração internacional! Me põe dúvidas sobre as recomendações do professor Leonel Caraciki do que se deve ler!
Pedro Paulo A. Funari, por exemplo, numa resenha de The Invention of the Jewish People, de Shomo Sand (professor de História Contemporânea na Universidade de Tel Aviv”) diz: “O livro de Sand representa um esforço sério e bem fundamentado de analisar um tema – a invenção da nação – de relevância universal, aplicado a um estudo de caso dos mais complexos e intricados. Nem sempre se precisa estar de acordo com as propostas interpretativas de Sand e o próprio autor não as apresenta, no geral, como verdades inefáveis, mas como possibilidades interpretativas a serem exploradas ou reconhecidas como válidas. Obra de referência, leitura obrigatória para os que se dedicam ao estudo do estado nacional moderno em qualquer contexto, merece ser lida com atenção e proveito.” (Diálogos, v. 15, n. 1, p. 233-235, 2011.)
É lamentável que o CAFÉ HISTÓRIA compartilhe um link no qual há uma recomendação para NÃO LER certos escritores.
Não sou formado em História, mas li A INVENÇÃO DO POVO JUDEU, de Shlomo Sand.
Em vez da sentença peremptória “Shlomo Sand por sua vez tem pouco compromisso com um trabalho sério e prefere produzir panfletos.”, que tal se nos apresentassem uma resenha crítica sobre a obra?
Dizer que Leonel Caraciki “analisa 10 obras” numa postagem que não chega a 60 linhas é uma piada.