Dez obras fundamentais para compreender melhor o Integralismo

20 de janeiro de 2017
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Professor do Departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande (FURG) indica 10 obras para quem deseja começar a estudar o Integralismo.

Por Odilon Caldeira Neto

Não é de hoje que os estudos sobre o integralismo estão em franca expansão. Isto pode soar contraditório, pois em negação das perspectivas de seus militantes, a Ação Integralista Brasileira (AIB) não chegou ao poder em 1937, assim como, nas décadas posteriores, as demais siglas que lhe sucederam não obtiveram grande protagonismo. Contudo, estudar o integralismo é não apenas tentar compreender os caminhos de suas diversas organizações políticas, mas discutir também as tentativas de reconstruir a identidade nacional e, além disso, propor ou impor um modelo autoritário para a sociedade brasileira.

Integralistas Ceará
Integralistas da cidade de Viçosa do Ceará na década de 1930. Da esquerda para direita: João Evangelista de Miranda (comerciante), Afonso Deocleciano Marques (dentista), Bastos Sampaio (tabelião), José Vitor Fontenele Filho (professor Juca), Vicente Miranda Filho (comerciante). Imagem: Domínio Público / Wikipédia.

1. TRINDADE, Hélgio. Integralismo: o fascismo brasileiro da década de 1930. 3ª ed. São Leopoldo: Editora Unisinos, 2016.

Originalmente produzida como tese de Doutorado na Université Paris 1, a obra de Hélgio Trindade é mais que parte da bibliografia pioneira sobre o tema, mas também referência quase obrigatória aos estudiosos dos movimentos autoritários na História Política brasileira. O autor aborda desde as relações intelectuais e políticas de Plínio Salgado, principal líder dos “camisas-verdes”, até a efervescência política das primeiras décadas do período republicano, especialmente em dimensões conservadoras, como as Ligas Nacionalistas e o Centro Dom Vital. Além das origens intelectuais e o processo de formação da AIB, a obra trata também da estrutura, da organização e das tendências internas, assim como de questões menos “oficiais”, como as disputas de poder da alta hierarquia. A primeira edição da obra, publicada na década de 1970, marca o esforço de diversos autores e autoras em compreender o fascismo brasileiro na década de 1930, assim como alguns de seus “legados” ao regime autoritário iniciado em 1964. Mais recentemente, em…

2. TRINDADE, Hélgio. A tentação fascista no Brasil: imaginário de dirigentes e militantes integralistasPorto Alegre: Editora UFRGS, 2016.

Hélgio Trindade retoma as discussões sobre a natureza fascista do Integralismo, além de trazer a público diversas entrevistas realizadas com militantes e dirigentes integralistas, parte substancial do trabalho que deu corpo à sua obra seminal.

3. MAIO, Marcos Chor. Nem Trotsky, nem Rotschild: o pensamento anti-semita de Gustavo Barroso. Rio de Janeiro: Imago, 1992.

Seja pela liderança ou por constituir a tendência majoritária na Ação Integralista Brasileira, grande parte das obras sobre o integralismo centram esforços na análise em torno de Plínio Salgado. Já alguns estudiosos buscaram analisar outros aspectos, fosse as demais figuras da alta hierarquia dirigente da AIB – como foi o caso do escritor Gustavo Barroso–, mas também temáticas como o antissemitismo, que se tornariam elementos problemáticos na História do integralismo. A obra de Marcos Chor Maio é uma das pioneiras na análise em torno do antissemitismo em Gustavo Barroso, que foi Chefe das Milícias da AIB e uma espécie de líder das tendências mais radicais da organização. Por essa razão, é não apenas uma análise sobre o antissemitismo barrosiano ou mesmo do impacto dessa questão no integralismo dos anos 1930, mas um valioso estudo sobre a questão antissemita no Brasil.

4. GERTZ, René. O fascismo no sul do Brasil: germanismo, nazismo, integralismo. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1987.

A obra de René Gertz é fundamental por ao menos três aspectos. Em primeiro lugar, trata do integralismo em uma perspectiva regional, auxiliando a evidenciar o fato de que o movimento adquiriu feições variadas com suas determinadas particularidades em diversas localidades do país. Além disso, trata de duas perspectivas que povoam o imaginário coletivo sobre o tema a partir de uma abordagem criteriosa sobre a relação nem sempre amistosa dos integralistas com fascistas e nazistas e, por fim, o estudo sobre as supostas conexões entre etnicidade de imigrantes e a vinculação com movimentos de cunho autoritário. Em termos historiográficos, o livro é um bom exemplo das possibilidades em observar as particularidades do “regional” para entendermos as vicissitudes do “nacional”.

5. CALIL, Gilberto. O Integralismo no Pós-Guerra: A Formação do PRP (1945-1950). Porto Alegre: EdiPUCRS, 2001.

6. ____________. Integralismo e Hegemonia Burguesa: a intervenção do PRP na política brasileira (1945-1965). Cândido Rondon: Ed. UNIOESTE, 2010.

As duas obras de Gilberto Calil tratam do Partido de Representação Popular, a principal organização integralista existente entre 1945 e 1965. São no mínimo duas imprescindíveis contribuições trazidas pelo historiador. Em primeiro lugar, observa o processo de rearticulação do integralismo após o Estado Novo, quando foi posto à ilegalidade, assim como caracterizado como “quinta-coluna” durante a Segunda Guerra Mundial. O retorno à democracia impôs aos integralistas a necessidade de moldar parte dos ideais da AIB às condições democráticas do período, ao mesmo tempo em que era prudente retomar aspectos doutrinários e simbólicos do integralismo nos anos 1930. Além dessa questão, Gilberto Calil analisa com profundidade a atuação do PRP em seu período de existência, inclusive a contribuição de integralistas, militantes e dirigentes, no processo do golpe de 1964.

7. GONÇALVES, Leandro Pereira. Plínio Salgado. Um católico integralista entre Portugal e o Brasil (1895-1975). Lisboa: Imprensa de Ciências Sociais, 2017 (no prelo).

A obra de Leandro Pereira Gonçalves é uma das importantes contribuições da historiografia mais recente do integralismo. Ao analisar os itinerários político e intelectual de Plínio Salgado, o autor desloca o centro analítico sobre o líder integralista para além do período da formação e atuação da Ação Integralista Brasileira. Empreende um exaustivo estudo sobre as relações entre a ideologia integralista em suas diversas fases e o conservadorismo, o catolicismo e as redes transnacionais de interação política e ideológica. Assim, observa o impacto de movimentos como a Action Française, o Integralismo Lusitano e a democracia-cristã nas trajetórias plinianas. Ao tratar sobre o exílio de Plínio Salgado em Portugal, o autor analisa as relações do antigo líder da AIB com o salazarismo, assim como a maneira como essas colaborações impactariam não apenas no processo de construção do Partido de Representação Popular, mas também a atuação política de Plínio Salgado durante a ditadura civil-militar.

8. BARBOSA, Jefferson Rodrigues. Chauvinismo e Extrema-direita: crítica aos herdeiros do sigmaSão Paulo: Ed. Unesp, 2016.

A obra de Jefferson Rodrigues Barbosa é a mais recente e valiosa contribuição para os estudos do integralismo na contemporaneidade, desde as modificações discursivas até as novas estratégias e as disputas entre os diversos grupos existentes. Para isso, o autor trata sobre o fim do Partido de Representação Popular (PRP), a ação intelectual dos “Águias brancas” (membros dos Centros Culturais da Juventude) e os elos com os atuais militantes integralistas. Fazendo jus aos novos tempos, a obra traz uma apurada análise sobre o uso da internet pelos integralistas, ferramenta que é utilizada seja como plataforma de divulgação, mas também como instrumento de formação política para os novos e antigos militantes do sigma, além de veículo de interação com outras organizações da extrema-direita brasileira.

9. SILVA, Giselda Brito. Estudos do Integralismo no Brasil. 2ª ed., Porto Alegre: EdiPUCRS, 2016.

As obras de coletânea são um bom caminho para se observar as novas produções na historiografia de um tema, assim como o diálogo entre novos pesquisadores e aqueles já consagrados. Publicada em 2007, “Estudos do Integralismo no Brasil”, organizada por Giselda Brito Silva e lançada recentemente em segunda edição, é pioneira na área. Além do pioneirismo, a obra traz importantes reflexões sobre diversos aspectos e objetos de estudos sobre o integralismo, fornecendo não somente um apanhado geral dos temas afins, mas também indicando novas possibilidades de pesquisa aos interessados na área.

10. BERTONHA, João Fábio. Bibliografia orientativa sobre o integralismo (1932-2007). Jaboticabal: FUNEP, 2010.

Fruto de anos de pesquisas sobre o integralismo no Brasil e suas relações com o fascismo internacional, João Fábio Bertonha traz uma contribuição essencial para os estudiosos do tema e demais interessados: um guia bibliográfico sobre o integralismo, que consegue fornecer um rigoroso apanhado sobre as obras destinadas a analisar o integralismo, mas também publicações diversas como coletâneas, artigos, anais de evento, etc. Embora as produções sobre o integralismo continuem em franco crescimento, a obra torna-se indispensável para as diversas gerações de pesquisadores do integralismo brasileiro e do fascismo de uma maneira geral. A obra marca, assim, não somente o domínio do autor em um campo tão fecundo e diverso, mas também aquilo já afirmado, ou seja: os estudos sobre o integralismo estão em franco e contínuo desenvolvimento.


Odilon Caldeira Neto é professor substituto do Departamento de História da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Doutor em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGH-UFRGS, 2016), com estágio de doutoramento (investigador visitante júnior) pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-Ulisboa). Em Portugal, foi bolsista da Fundação Calouste Gulbenkian e da CAPES, no Brasil. Mestre em História pela Universidade Estadual de Maringá (PPH-UEM, 2011), Especialista em História Social e Ensino de História pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), Graduado em História (bacharelado e licenciatura) pela Universidade Estadual de Londrina (UEL). Autor de “Sob o Signo do Sigma: Integralismo, Neointegralismo e o Antissemitismo” (Eduem/2014). Tem experiência na área de História, com ênfase em História Contemporânea e do Tempo Presente, atuando principalmente nos seguintes temas: Radicalismos de Direita, Conservadorismo Político, Autoritarismos, Nacionalismos, Fascismos, Neofascismos e Antissemitismo. Coordenador e investigador da Rede Internacional de Investigação “Direitas, História e Memória” (http://direitashistoria.net), Secretário do GT Nacional “Direitas, História e Memória” da ANPUH, Pesquisador Associado ao Grupo de Trabalho “Derechas contemporáneas: dictaduras y democracias” (Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales, CLACSO). Contato: [email protected].

Odilon Caldeira Neto

Professor do Departamento de História da Universidade FEderal de Juiz de Fora. Doutor em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com doutorado-sanduíche no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa. Possui pós-doutorado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Autor de “Sob o Signo do Sigma: Integralismo, Neointegralismo e o Antissemitismo”. Coordenador da Rede “Direitas, História e Memória” (http://direitashistoria.net). Academia.edu: http://ufsm.academia.edu/OdilonCaldeiraNeto. Escreveu uma bibliografia comentada sobre Integralismo para o Café História.

9 Comments Leave a Reply

    • Obrigado pela indicação, Rogério. Nas nossas biblios comentadas nós não colocamos fontes. Apenas historiografia. Mas com certeza a leitura dos próprios integralistas é fundamental. Abraço!

  1. A gente ja percebe que o cara foi procurar integralismo pelo proprio bico quando esta colocando o integralismo como algo proximo ao fascismo sendo que o proprio não quer controle absoluto do estado ou sequer quer empresas gananciosas atrás das nossas riquezas,se você quer mesmo saber de integralismo procura a doutrina do sigma

    • Oi, Nicholas. O “cara” é um professor, uma das principais referências no tema.
      Mas sempre há espaço aqui para divergências.
      Qual historiografia você costuma seguir para pensar o integralismo?

    • Oi, Julio. Tudo bem? Obras primárias não entram, pois essa nossa editoria se chama “bibliografia comentada”. Ficamos mesmo na literatura especializada. Abraço!

  2. Olá, Odilon, notei em sua resposta, mas por que não ler as obras primarias ? Seria interessante em saber o que os integralistas defendiam, pois muitos gostam de difamar o integralismo mesmo não sabendo

    • Oi, Júlio. Tudo bem? Quem respondeu foi o Café História e não o Odilon.
      O Odilon não diz para não ler obras primárias. E ele é um grande conhecedor dessas obras.
      Mas o recorte dessa editoria, como apontamos, diz respeito apenas mesmo a bibliografia sobre o tema.
      Grande abraço!

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