Renascimento italiano: o que foi, o que não foi e o que ler para saber mais

Um dos mais famosos temas históricos tem também uma das mais ricas bibliografias. Confira esta bibliografia comentada sobre o Renascimento italiano.
24 de fevereiro de 2025
O Nascimento de Vênus de Botticelli, ícone do Renacimento Italiano.
O Nascimento de Vênus de Botticelli.

O Renascimento Italiano (um dentre vários outros) foi um movimento de renovação cultural nas letras, nas artes e nas ciências que teve lugar na Itália, a partir dos séculos XIV-XV, e na Europa, a partir dos séculos XV-XVI. Ele se caracterizou por um renovado interesse pela cultura clássica greco-romana, pela valorização do humanismo e pela ênfase na razão, na ciência e no potencial humano.

Artistas como Leonardo da Vinci, Michelangelo e Rafael, além de escritores como Maquiavel e Petrarca, exemplificam esse período extremamente criativo, que também trouxe inovações na arte, arquitetura e filosofia, influenciando profundamente o desenvolvimento cultural e intelectual da Europa.

Para saber mais sobre o tema, preparei uma bibliografia comentada com várias perspectivas e fotos, que vai te ajudar a ganhar mais profundidade neste estudo. Separei as sugestões em bloco a fim de facilitar a leitura de cada tipologia.

BYINGTON, Elisa. O projeto do renascimento. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.

Para quem conhece pouco ou até mesmo nada sobre o tema, recomendo esse livrinho de bolso, de Elise Byngton. Ele tem apenas 81 páginas, mas faz um ótimo resumo sobre o tema. É um dos livros de que mais gosto, escrito por autora brasileira. Ele pode ser encontrado, hoje, em sebos, ou no site da editora, sob demanda.

BROTTON, Jerry. O Bazar do Renascimento: da Rota da Seda a Michelangelo. São Paulo: Grua, 2009.

GOODY, Jack. Renascimentos um ou muitos? São Paulo: Editora da UNESP, 2011

Para quem procura por novidades, esses dois livros são importantes, porque trouxeram para o público brasileiro as perspectivas historiográficas mais recentes da historiografia anglo-americana sobre o Renascimento. Em ambos, o Renascimento é entendido como o momento inicial da Época Moderna, e ambos buscam entender também esse período da história em perspectiva global.

Tanto Brotton quanto Goody são muito críticos ao eurocentrismo de obras de autores como Jules Michelet (1748-1874) e Jacob Burckhardt (1818-1897) (A cultura do Renascimento na Itália: um ensaio. São Paulo: Cia das Letras, 2009), que na segunda metade do século XIX, propuseram as primeiras interpretações para o Renascimento.  

Rosso Fiorentino: Pietà, 1537-1540. Louvre. Obra do Renascimento Italiano.
Rosso Fiorentino: Pietà, 1537-1540. Louvre.

Assim, os autores reiteram a relação entre Renascimento e modernidade, na contramão de historiografia produzida no resto do continente europeu, onde, na reflexão historiográfica desde meados do século XX, o nexo entre Renascimento e mundo moderno paulatinamente se enfraquece e o baricentro construtivo de modernidade se desloca para o século XVIII e a chamada “Revolução Científica”.

Kristeller, Paul Oskar. Tradição Clássica e Pensamento no Renascimento Italiano. Lisboa: Edições 70, 1995.

Garin, Eugênio. Ciência e vida civil no Renascimento italiano. São Paulo: Editora da UNESP, 1994.

Bignotto, Newton. Origens do republicanismo moderno. Rio de Janeiro: EDUFF, 2021.

Pocock, John G. A. O momento maquiaveliano: o pensamento político florentino e a tradição republicana atlântica. Niterói: Eduff, 2021.

Falar de Renascimento não é falar apenas de Renascimento. É falar também de muitos outros fenômenos históricos e movimentos de ideias. O Renascimento Italiano tem, nos últimos 50 anos, voltado o eixo da reflexão historiográfica para o estudo dos mais variados aspectos do renascimento literário-filosófico, que, desde o século XIX passou a ser identificado pelo termo “Humanismo”.

Infelizmente, poucos desses estudos foram traduzidos para a língua portuguesa. Grosso modo, praticamente tudo do pouco que foi traduzido para o português sobre esse movimento diz respeito a escritos originalmente produzidos antes da década de 1980 e, sobretudo, dedicados àquilo que a historiografia do século XX denominou por “Humanismo Cívico”, concepção forjada por Hans Baron (1900-1988) (curiosamente nunca traduzido para o português) e Eugênio Garin (1909-2004), que se tornou o centro do debate no campo da história das ideias nas décadas centrais do século passado. Apesar das lacunas, as quatro obras listadas acima são boas.

O livro de Paul Oskar Kristeller foi originalmente publicado em língua inglesa, em 1955. Kristeller é um nome incontornável nos estudos sobre o Humanismo, sobretudo por assinalar com maestria tanto as rupturas introduzidas quanto as importantes continuidades em relação a tradição retórica medieval.

Parmigiano faz parte do Renascimento.
Mais detalhes
Parmigianino: Madonna com o Menino e santos, c. 1530. Uffizi

Já o livro de Eugênio Garin foi publicado originalmente em italiano, em 1965. É uma coletânea que reúne textos derivados das conferências proferidas por Eugênio Garin em torno de temas ligados aos ideais ético-políticos que se difundiram nas cidades italianas durante o século XV.

A obra de Pocock, originalmente publicada, em língua inglesa, em 1975, oferece uma análise penetrante do pensamento político cultivado em Florença a partir da segunda metade do século XIV e dos seus desdobramentos na Inglaterra de meados do século XVII e na América do Norte setecentista.

Bignotto, Newton. Origens do republicanismo moderno. Rio de Janeiro: EDUFF, 2021.

Ainda falando de humanismo e de suas conexões com o Renascimento, indico também o livro de um brasileiro, Newton Bignotto. Publicado pela primeira vez pela editora da UFMG, em 2001, este livro foi determinante para a recepção do debate acerca do Humanismo cívico no Brasil. Analisa, sob o prisma da filosofia política, escritos produzidos por humanistas italianos, ao longo dos séculos XIV e XV.

GOMBRICH, Ernst. Por uma história cultura. São Paulo: Martins Fontes, 1994.

Falar de Renascimento também falar de História Cultural, que é um movimento historiográfico muito famoso nos estudos históricos. A História Cultural estuda as manifestações culturais e suas relações com o mundo das ideias e das práticas sociais.

Foi com base no pressuposto de que a arte e a ciência, enquanto manifestações culturais, relacionavam-se diretamente com o espírito de sua época (Zeitgeist), que toda a História Cultural (Kulturgeschichte) e parte significativa da História da Ciência, do século XX, se erigiram. Nesse sentido, talvez a leitura mais importante sobre a história da história do Renascimento seja esse pequeno livro de Ernst H. Gombrich.

Yates, Frances A. Giordano Bruno e a tradição hermética. São Paulo: Cultrix, 1995.

Garin, Eugenio. O Zodiaco da Vida: a polémica sobre a astrologia do século XIV ao século XVI. Lisboa: Estampa. 1988.

Entretanto, a busca por uma unidade orgânica na cultura do Renascimento acabou, na verdade, por expor os limites sociais, intelectuais e geográficos da renovação proposta pelos humanistas. Nasce assim uma linhagem de estudos que tratam a arte e a ciência do Renascimento Italiano como um problema em si, separado do problema da modernidade.

A reflexão sobre a ciência humanista, por exemplo, passa a levar em consideração também saberes que hoje estão bem distantes daquilo que se admite como “científico”, como a astrologia, a alquimia, a cabala, a magia e as artes adivinhatórias. Saberes antes desprezados por uma historiografia que interpretava a modernidade como um processo de progressiva racionalização do mundo e deixava de lado conhecimentos e práticas que lhe pareciam inconciliáveis com a sua visão da “ciência moderna”. Nessa linha, destaco o trabalho seminal da Frances Yates (1899-1981) e os últimos trabalhos de Eugenio Garin.

Apesar de algumas fraquezas metodológicas, a obra de Francis Yates, publicada pela primeira vez em 1984, é de uma importância ímpar por assinalar uma vertente pouco considerada no ambiente cultural humanista: a tradição mágico-hermética, que desempenhou papel de relevo nos modos de investigação do mundo natural entre os séculos XV e XVII. Enquanto isso, Garin discute o lugar da astrologia no início da época Moderna. Duas obras que valem muito a leitura, por saírem do lugar-comum.

Um bônus: o Renascimento na História da Arte

No campo da História da Arte do Renascimento Italiano, as traduções nunca cessaram de acontecer. A renovação artística que teve lugar na Itália continua gerando boas publicações no Brasil, algumas colocando em diálogo Humanismo e Renascimento artístico. Abaixo, indico os títulos que considero mais interessantes: 

Baxandall, Michael. Giotto e os oradores. As observações sobre pintura e a descoberta da composição pictórica (1350-1450). São Paulo: Edusp, 2018.

Castelnuovo, Enrico. Retrato e sociedade na Arte Italiana: ensaios de história social da arte. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

Chastel, André. Arte e Humanismo em Florença na época de Lourenço o Magnífico: estudos sobre o Renascimento e o Humanismo. São Paulo: Cosac Naify, 2012.

Ginzburg, Carlo. Indagações sobre Piero. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.

Gombrich, Ernst H. Norma e Forma: estudos sobre a arte da Renascença. São Paulo: Martins Fontes: 1990.

Panosfsky, Erwin. Estudos de Iconologia: temas humanísticos na arte do renascimento. Lisboa: Editorial Estampa, 1986.

Warburg, Aby. A renovação da Antiguidade pagã: contribuições científico-culturais para a história do Renascimento europeu. Rio de Janeiro: Contraponto, 2013.

Como citar esta bibliografia comentada

MACHEL, Marília de Azambuja Ribeiro. Renascimento italiano: dos livros básicos aos mais sofisticados (Bibliografia Comentada). In: Café História. Disponível em: https://www.cafehistoria.com.br/renascimento-italiano-bibliografia. Publicado em: 24 fev. 2025. ISSN: 2674-5917.

Marília de Azambuja Ribeiro Machel

Professora titular de História Moderna na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Foi pesquisadora visitante no Centro de Humanidades (CHAM) da Universidade Nova de Lisboa. Sua pesquisa atual é apoiada pelo CNPq.

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