Ensino de história sem a gente do campo? Um material didático para combater esse problema

Professora desenvolveu material didático gratuito para professores do ensino básico usarem em suas aulas de história.
1 de fevereiro de 2025
Homens trabalham em plantação. Estão de costas e um deles carrega uma caixa de alimento. Material didático busca incluir esses trabalhadores.
Trabalhdores do campo são parte fundamental da história brasileira. Foto: Cortesia de Tim Mossholder (Unplash).

Segundo o censo demográfico de 2022, o Brasil tem 25,6 milhões de pessoas vivendo em áreas rurais. O número é menor em relação ao Censo de 2010, quando foram registradas 29,8 milhões de pessoas morando nessas regiões – uma queda de 4,3 milhões na população rural. Mas, apesar da diminuição, a população rural do Brasil ainda corresponde a 12,6% do total de pessoas que vivem no país.

Pensando na importância dessa parcela da população brasileira, a pesquisadora Adriana Mastrangelo Ebecken criou cadernos temáticos sobre a população do campo para professores da educação básica usarem em suas aulas de história”.

O material é resultado da dissertação “Atores (in)visíveis: a população do campo no ensino de história”, defendida por ela, em 2022, no Mestrado Profissional em Ensino de História da Universidade Federal Fluminense. O trabalho e o material podem ser acessados aqui.

“Este trabalho propõe (…) pensar a ausência da população do campo no ensino de História do Brasil na educação básica. Nesse sentido, busca compreender o contexto em que essa se insere, ou seja, a realidade agrária brasileira, entendendo os problemas que a concentração de terras traz, as formas como se desenvolvem as relações sociais na organização da produção agrícola e a evolução da luta política e de classes para o controle dos territórios e da posse da terra – meio de produção necessário para a reprodução da vida humana no campo”, explica Adriana.

A dissertação está dividida em cinco capítulos. Nos primeiros quatro capítulos, a pesquisadora aborda o campesinato brasileiro, a estrutura social e agrária do Brasil, o coronelismo e legislações sobre o tema, como a Lei de Terras de 1850. No capítulo final, são apresentados os cadernos temáticos desenvolvidos para serem utilizados em sala de aula.

“Como produto, se propôs a construir cadernos temáticos sobre a história da população do campo para ser abordada no ensino de História a fim de familiarizar tanto professores da rede básica quanto seus alunos com as condições de vida e o protagonismo desses personagens para a transformação de sua realidade e, consequentemente, da realidade social brasileira”, conta Adriana.

Material didático de história necessário

Antes de se tornar professora de História, Adriana participou da organização de acervos do Núcleo de Pesquisa, Documentação e Referência sobre Movimentos Sociais e Políticas Públicas no Campo (NMSPP), ligado à Linha de Pesquisa Movimentos Sociais do Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

O NMSPP dispõe de documentação relativa aos movimentos sociais do campo, bem como arquivos que tratam da construção do sindicalismo rural no Brasil e das políticas públicas voltadas para a população do campo.

“A vivência em sala de aula e uma aproximação com as diretrizes curriculares, no Brasil, trouxe a compreensão prática de que o currículo do ensino de História é um espaço de disputa, ou seja, em paralelo com o trabalho desenvolvido no NMSPP ficou claro que a população do campo não aparece na sua complexidade e relevância no ensino de História na Educação Básica”, reflete Adriana.

Mulheres agricultoras realizam a 7ª Marcha das Margaridas, em Brasília.
Mulheres agricultoras realizam a 7ª Marcha das Margaridas, em Brasília, em 16/08/2023. Foto: JoédsonAlves/Agência Brasil.

Com essa experiência em ambas as áreas, Adriana passou a elaborar os cadernos didáticos. O material trata de sujeitos históricos compreendidos em um recorte temporal que se inicia na década de 1950 e adentra os anos 2000.

“O recorte temporal foi feito porque é a partir da década de 50 que a luta dos trabalhadores toma maior visibilidade a partir da formação de associações, uniões e das Ligas Camponesas, ou seja, da manifestação de uma maior organicidade da população do campo por direitos sociais”, pontua Adriana.

Como são compostos

Os cadernos didáticos são compostos de um capítulo introdutório de apresentação do material para o professor e estudante, seguido de textos que aproximam o conteúdo das fontes trabalhadas para cada sujeito histórico. Os agentes escolhidos foram a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (Ultab), em São Paulo, as Ligas Camponesas, na região nordeste, Dona Rosa Geralda da Silveira, produtora de farinha no Quilombo da Caveira, na região de Cabo Frio (Rio de Janeiro), o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), e a Marcha das Margaridas.

“Ao se dar mais visibilidade aos atores sociais do campo brasileiro no ensino de história, se permite construir um conhecimento histórico escolar que perceba a atuação da população do campo na busca pela transformação da sociedade brasileira. Trata-se de olhar a história do Brasil sobre uma nova perspectiva, compreendendo a emergência das demandas populares e da capacidade desta de se autopensar e pensar seu lugar no mundo, conclui Adriana.

Sugestão de leitura

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Bruno Lima

Graduado em Jornalismo e História. Meste em História pelo Programa de Pós-graduação em História Social na Universidade de Brasília (UnB). Dedica-se a estudos de História do Brasil República, com ênfase na Era Vargas, direitos trabalhistas, História Social do Trabalho, Justiça do Trabalho, comunismo e anticomunismo e PCB nos anos 1930. Escreve regularmente sobre mestrado profissional em História (ProfHistoria) para o Café História.

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