Justiça italiana diz que Alemanha tem que pagar indenizações por massacre nazista na Itália

Em 1943, tropas nazistas, suspeitando que a população de Pietransieri apoiava os combatentes da resistência italiana, executaram 128 civis desarmados. Agora, a decisão sobre as indenizações pelo massacre nazista está nos tribunais.
18 de janeiro de 2025
Bandeira italiana tremula contra um céu azul. A foto simboliza a disputa nos tribunais quanto ao massacre nazista de 1943.
Massacre nazistas de 1943 está agora nos tribunais. Foto de Jeppe Mønster, do Unplash.

A Justiça italiana determinou no último dia 9 de dezembro que a Alemanha pague uma indenização de €4 milhões (US$ 4,2 milhões) a familiares de italianos que foram vítimas do massacre nazista ocorrido na vila de Pietransieri, durante a Segunda Guerra Mundial.

A decisão, emitida por um tribunal de apelação em L’Aquila, no centro da Itália, leva em consideração 30 pessoas que perderam parentes na atrocidade, mas que não haviam sido incluídas em decisões judiciais anteriores. O valor total das compensações atribuídas ao governo alemão chega, com esta decisão, a €15 milhões (mais de 80 milhões de reais).

A agência de notícias italiana ANSA informou que a decisão foi uma resposta às objeções levantadas por esses indivíduos, que agora serão contemplados pela justiça com a medida compensatória.

As compensações serão financiadas com parte dos fundos de recuperação econômica da União Europeia destinados à Itália no contexto do pós-pandemia de COVID-19. Esses recursos incluem uma seção específica para reparações relacionadas a crimes nazistas e devem ser repassados ao governo italiano pela Alemanha nos próximos meses.

O massacre de Pietransieri aconteceu em 21 de novembro de 1943, na floresta de Limmari, próxima à vila de Pietransieri, na região central da Itália. Tropas nazistas, suspeitando que a população local apoiava os combatentes da resistência italiana, executaram 128 civis desarmados. Entre as vítimas estavam 60 mulheres, 34 crianças com menos de 10 anos e diversos idosos.

Massacre nazista nos tribunais

Em 1962, a Alemanha pagou à Itália 40 milhões de marcos alemães, equivalentes a pouco mais de 1 bilhão de euros em valores atuais, para cobrir os danos causados pelas forças nazistas ao Estado italiano e seus cidadãos durante a Segunda Guerra Mundial. Em contrapartida, a Itália, dali em diante, deveria arcar com novas demandas.

Mas não foi bem isso o que aconteceu. Em 1994, um armário foi encontrado nos escritórios dos promotores militares de Roma, abarrotado de arquivos documentando centenas de crimes de guerra que nunca haviam sido processados. Esse armário foi chamado de “armário da vergonha”.

O caso motivou a ida de centenas de familiares de antigas vítimas à justiça. A Itália, então, deu ganho de causa aos pleiteantes, mas determinou que a Alemanha pagasse os valores das indenizações. Em 2008, por exemplo, um desses processos determinava que o governo alemão pagasse um milhão de euros a nove pessoas. A Alemanha, contudo, alegou que o acordo de 1962 a desobrigava desse pagamento. Começava com aquilo um litígio longo na justiça. Berlim acompanhou o caso com atenção, acreditando que, se a Itália vencesse a causa, outros países, onde também haviam ocorrido outros massacres nazistas, poderiam fazer o mesmo.

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Pietransieri, Itália, onde ocorreu, em 1943, o masascre nazista. Foto: Wikimedia Commons.

Em 2012, a Corte Internacional de Justiça, sediada em Haia, nos Países Baixos, apoiou Berlim, declarando que as alegações italianas sobre o massacre nazista de 1943 eram legalmente inadmissíveis. Em 2013, a Itália acatou o resultado e aprovou uma lei que incorporou o julgamento de Haia à legislação nacional. Mas, em 2022, os tribunais do país abriram novos casos de indenização, dizendo que nenhum limite poderia ser imposto a crimes de guerra.

Diante do caso, a Alemanha entrou com uma ação contra a Itália na mais alta corte da ONU, que reconheceu que os alemães estavam certos. Ironicamente, teria a Itália, agora, que arcar com os processos que sua própria justiça abrira. Na época, o Primeiro-Ministro italiano criou, então, um fundo de 61 milhões de euros para tentar quitar tudo.

O estado atual do caso

Em outubro de 2024, mais uma reviravolta. A Suprema Corte Italiana, em Roma, anulou a lei de 2013, dando novo fôlego a pedidos indenizatórios, que, no entendimento italiano, devem, sim, ser pagos pela Alemanha. A decisão de dezembro, imputando à Alemanha o valor de mais indenizações, é o mais recente capítulo desse imbróglio histórico jurídico sem fim envolvendo o massacre nazista.

Segundo o portal Voa News, “Organizações judaicas na Itália acreditam que Berlim deveria estar pagando para reconhecer sua responsabilidade histórica. Mas grupos de vítimas também temem que Roma esteja enrolando para lidar com uma enxurrada de reivindicações que podem pesar nas contas do estado.”

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Em meados de 1950, a imprensa soltou uma bomba que chocou a opinião pública brasileira: o imigrante letão Herberts Cukurs, criador e proprietário dos pedalinhos da Lagoa Rodrigo de Freitas, cartão postal do Rio de Janeiro, havia cometido crimes de guerra durante a ocupação nazista da Letônia. Neste livro, que vai virar filme, o historiador Bruno Leal, professor da Universidade de Brasília e criador do Café História, investiga o chamado “Caso Cukurs”, desde a chegada de Cukurs no Brasil até a sua execução por agentes secretos do Mossad, de Israel. Livro disponível nas versões impressa e digital. Confira aqui. 

Bruno Leal

Fundador e editor do Café História. É professor adjunto de História Contemporânea do Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB). Doutor em História Social. Pesquisa História Pública, História Digital e Divulgação Científica. Também desenvolve pesquisas sobre crimes nazistas, justiça no pós-guerra e as duas guerras mundiais. Autor de "Quero fazer mestrado em história" (2022) e "O homem dos pedalinhos"(2021).

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