Com quantos memes se faz uma aula de História?

Dá pra aprender história rindo? Dá sim. Flávio de Carvalho Pereira, professor do Ensino Médio da rede pública de Camaçari, Bahia, estimula a aprendizagem de jovens alunos com memes.
21 de dezembro de 2024
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Dá pra aprender história rindo? O professor Flavio de Carvalho Pereira mostra que sim. Foto: Cava (meramente ilustrativa).

Quem utiliza as redes sociais com frequência está habituado a receber imagens, vídeos e áudios que são compartilhados e replicados milhares, às vezes milhões de vezes por mensagens e postagens. Na linguagem da internet, o conteúdo que alcança muita repercussão entre os usuários é chamado de meme e um dos principais responsáveis por fazer com que um tema viralize é o público mais jovem.

Percebendo essa tendência entre os estudantes do Ensino Médio, um professor de Camaçari, na Bahia, decidiu usar os memes nas aulas de História. A proposta do professor Flávio de Carvalho Pereira foi estimular os alunos a produzirem memes relacionados à história local do município baiano. A atividade é resultado da dissertação ‘“Camaçacity” no centro do mundo: ensino de história local com produção de memes”, defendida por Pereira, em 2023, no Mestrado Profissional em Ensino de História da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). O trabalho pode ser acessado aqui.

“O nome da dissertação traz um neologismo, “Camaçacity”, que é de uso comum entre uma geração que, mesmo com as críticas à “Camaçahell”, com as suas desigualdades sociais e à baixa visibilidade da história e cultura locais, têm um sentimento de pertencimento com Camaçari, a “Camaçacity”. A “Camaçahell” é feita da redução à Cidade Industrial, que sufoca a cultura local, alternativa às narrativas dominantes”, explica Pereira.

O trabalho está dividido em três capítulos. No primeiro, o autor faz uma revisão bibliográfica debatendo o ensino da História Local, o uso de memes no ensino de História e suas relações com a narrativa histórica, cultura digital e cultura juvenil. Ainda no primeiro capítulo, são abordadas as representações e a construção de identidades e os conceitos de território, região e local. O segundo capítulo trata da história de Camaçari e os elementos do processo de industrialização e urbanização do município. A parte final descreve o desenvolvimento e apresenta os resultados da pesquisa.

“É interessante destacar que os memes são produtos de um contexto sociocultural específico e, muitas vezes, referenciam situações, eventos ou tendências atuais. Por esse motivo, os professores podem aproveitar essa linguagem na sala de aula para enriquecer o aprendizado dos alunos e promover a consciência histórica”, sugere Pereira.

História Local e memes

Memes na escola podem ser uma boa.

Segundo o censo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, Camaçari tem a quarta maior população da Bahia, com 299.579 pessoas, e é o município com maior extensão territorial da Região Metropolitana de Salvador. Ainda segundo o IBGE, Camaçari possui o maior Complexo Industrial Integrado do Hemisfério Sul. 

O processo de industrialização do município se intensificou a partir da década de 1970, com a implantação de um Polo Petroquímico. Além da atividade industrial, Camaçari também tem o turismo de veraneio como vetor importante para a economia local. Apesar de todas essas especificidades, Pereira conta que há na população local uma ausência de sentimento de pertencimento, expressada em falas depreciativas em relação ao município.

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Capa da dissertação defendida em 2023 pelo professor no Mestrado Profissional em Ensino de História da Universidade do Estado da Bahia – UNEB.

“Quando me propus a desenvolver uma solução para o problema que se encontrava em sala de aula, no caso, a expressão de identidade negativa, um certo falar mal de si falando mal da própria cidade como se não tivesse nada a ver com ela, não se vendo na história e cultura local, sabia que poderia fazer minha parte, que é levar o conhecimento histórico para sala de aula para uma aprendizagem histórica significativa em que eles desenvolvessem a consciência histórica e a capacidade de questionamento e crítica das identidades e suas representações dominantes, que às vezes eles mesmo reproduziam sem saber”, afirma.

A partir dessa percepção, o pesquisador desenvolveu uma pesquisa-ação com uma turma da disciplina eletiva História Local, do Colégio Modelo Luís Eduardo Magalhães. A iniciativa contemplou várias etapas como revisão de literatura, estudo da legislação e das normas que orientam a Educação e o Ensino de História, análise documental acerca do contexto histórico, cultural e social do território de Camaçari, aplicação de questionários aos estudantes, desenvolvimento de aulas-oficina temáticas com produção de memes, entre outros.

 “O estudo explora memes criados no território que se referem às características do contexto local, e a divulgação de trabalhos acadêmicos existentes para inspirar a produção dos ditos memes, usados para contextualizar o ensino de história e fortalecer a construção de identidades nas escolas públicas do município. Além disso, investigaram-se os impactos desta abordagem na compreensão dos alunos sobre a história local”, conclui Pereira.

Bruno Lima

Graduado em Jornalismo e História. Meste em História pelo Programa de Pós-graduação em História Social na Universidade de Brasília (UnB). Dedica-se a estudos de História do Brasil República, com ênfase na Era Vargas, direitos trabalhistas, História Social do Trabalho, Justiça do Trabalho, comunismo e anticomunismo e PCB nos anos 1930. Escreve regularmente sobre mestrado profissional em História (ProfHistoria) para o Café História.

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