Alexandre Vieira, professor de História de uma escola pública no interior do estado de São Paulo, produziu um ciclo formativo sobre a História de comunidades indígenas para ser desenvolvido com professores da Educação Básica. Essa proposta pode ser acessada gratuitamente em seu trabalho final para o ProfHistória, “Por um Ensino de História decolonial: os Tupi Guarani do alto Paranapanema”, defendido em 2020, na Universidade Estadual de Ponta Grossa.
A formação desenvolvida por Vieira possibilita o diálogo entre professores de diferentes escolas e o intercâmbio de experiências docentes. O professor pensou em uma proposta a ser desenvolvida em ciclos de formação na cidade de Piraju/SP, onde fica localizado o Alto Paranapanema e a aldeia do povo da etnia Tupi Guarani, que colaborou com sua pesquisa. A proposta está organizada para ser desenvolvida em três encontros formativos, com duração de 8 horas.
Seu principal objetivo é a virada de olhar para a História dos povos indígenas, com embasamentos em perspectivas decoloniais e nas próprias narrativas indígenas. Por isso, o ciclo formativo pode ser realizado em diferentes localidades, com as devidas adaptações pertinentes à historiografia indígena de cada região.
Parte 1: visitas de Campo
A primeira atividade proposta por Vieira é uma visita à aldeia Tekoa Porã/SP, do grupo étnico Tupi Guarani. Nesta etapa, cada professor presente na formação deve receber uma ficha, a ser preenchida ao final da visita, com as seguintes perguntas: “O que já sabia sobre a comunidade? O que aprendeu? O que é relevante que meus alunos aprendam?”.
Com a visita dos professores à aldeia, Vieira sublinha que as populações indígenas são fundamentais na construção do tempo presente. Além de reforçar a ideia de que os povos indígenas possuem narrativas próprias, para além do que é destacado no livro didático. O professor também sugere outras duas visitas para o primeiro encontro formativo: o Sítio Arqueológico do Morro do Trem e o Museu Histórico do Centro Regional de Pesquisas Arqueológicas Mário Neme. Essas visitações são importantes, como aponta Vieira, para que os professores possam identificar os potenciais pedagógicos presentes nesses espaços.
Vieira pretende também que os professores envolvidos com a formação tomem consciência de que o povo Tupi Guarani de Paranapanema possui protagonismo na constituição da História da região. Os artefatos expostos no Museu Histórico e os caminhos percorridos no Sítio Arqueológico são alguns elementos que evidenciam as memórias sensíveis, as lutas travadas e as conquistas dessa comunidade no que diz respeito ao direito à terra e moradia dignas e à sua própria História.
Parte 2: sensibilização do olhar
Para o segundo encontro do ciclo formativo, Vieira sugere que seja ouvida a música indígena “Nharombaraete Karai Poty”, “Vamos nos fortalecer, Karai Poty”, em português. A cantiga faz referências a rezas e outros elementos da religiosidade Guarani tidos como símbolos de tradição e fortalecimento. O professor sugere um aprofundamento na discussão sobre a canção, abrangendo a diversidade entre os povos indígenas a fim de romper com a ideia estereotipada e genérica difundida no Brasil em razão do racismo estrutural.
Em seguida, o professor indica a apresentação do vídeo “Índios no Brasil 1. Quem são eles”, disponível neste link. O material audiovisual é apresentado pelas lideranças indígenas Ailton Krenak e Davi Kopenawa. As entrevistas devem servir de base para o diálogo com os professores sobre o racismo presente nas expressões “índio”, “oca” e “tribo”, por exemplo. Tais expressões sugerem a ideia genérica das populações indígenas e prejudicam o reconhecimento de sua História.
Em contraponto a essa perspectiva, Vieira propõe um debate sobre a diversidade dos povos indígenas no Brasil. O professor apresenta o material produzido pelo Instituto Socioambiental, que apresenta imagens de diferentes povos indígenas, com vestimentas e grafismos característicos da cultura de cada grupo étnico. Vieira também fala da importância de se apresentar tabelas do IBGE com listas de povos/etnias e seus principais troncos linguísticos.
Como conclusão do encontro, o professor sugere que os docentes produzam planos de aula que relacionem as visitas de campo realizadas no primeiro encontro com os diálogos estabelecidos no segundo encontro da formação.
Parte 3: “rotação por estações”
Para o último encontro do ciclo formativo, Vieira prevê dois momentos, com exercícios teóricos e práticos. O professor propõe que o encontro seja iniciado com a apresentação da Teoria Decolonial. O principal debate sugerido por Vieira gira em torno da colonialidade do saber, ao questionar os conhecimentos pretendidos universais e acabam por silenciar a História das populações minorizadas.
Em seguida, a conclusão dos encontros deve acontecer com uma “Rotação por estações”, desenvolvida em uma sala organizada em cinco espaços, por onde os professores irão circular. Cada estação possui um conjunto de materiais, fontes e eixos que abrem possibilidades de diálogo. As estações estão organizadas em: “Resistência Indígena”, “Idas e vindas dos Tupi Guarani”, “Língua: quando a cultura fala”, “Uma cartografia ancestral” e “Espiritualidade Tupi Guarani”.
Vieira aprofunda as possibilidades de práticas pedagógicas ao apresentar diferentes linguagens aos docentes no ciclo formativo. O professor de História reúne conteúdo audiovisual, experimentações junto à comunidade indígena, materiais didáticos e dados institucionais. Esses elementos, articulados, contribuem na ampliação do repertório dos professores da educação básica sobre a diversidade dos povos indígenas no Brasil, colaborando com o enfrentamento do racismo estrutural.