Desde o início do século XX, o passado é objeto de histórias em quadrinhos. Tintim (1929) e Spirou (1938) são os exemplos mais populares ao mobilizar eventos do passado em narrativas do presente. No Brasil, a narrativa histórica em quadrinhos (bandas, em Portugal) ganhou grande impulso nos 1990, quando o formato deixou de ser associado somente à leitura infanto-juvenil e passou de vez a ser vista como objeto cultural de consumo de adultos. Nos últimos anos, são várias as opções que contemplam a História do Brasil, sobretudo abordando temas como povos indígenas e escravizados. Há por aí material excelente de sobra para quem deseja conhecer a história do país de forma lúdica e professores em busca de bons materiais para uso em sala de aula. Confira a nossa seleção.
(1) “Revolta da Vacina” (André Diniz)
Trabalho muito cuidadoso de André Diniz. Amparado em pesquisa histórica, Diniz explora a conhecida revolta ocorrida em 1904, no Rio de Janeiro. Naquele ano, a cidade vivia uma crise social e sanitária. Insatisfeitos com a falta de transparência e planejamento humanizado das autoridades sanitárias da então capital, parte do povo, especialmente a parte mais pobre, se revolta contra o poder público. Diniz é autor premiado. Em 2012 venceu o conceituado prêmio HQ MIX, como melhor roteirista nacional.
(2) “Ditadura no ar: coração selvagem” (Raphael Fernandes e Rafael Vasconcellos)
A história se passa em São Paulo, 1969, depois da promulgação do AI-5. Após o desaparecimento de sua namorada Lenina, o fotógrafo Félix Panta entra em uma investigação para descobrir o que os militares fizeram com a estudante comunista. Músicas de protesto, exilados políticos, reportagens proibidas e o terror das torturas estarão em seu caminho nesse Brasil onde a população alienada encobre a ação de ódio dos que estão no poder. Baseada em relatos reais e em uma extensa pesquisa histórica, a HQ é uma ficção inspirada nos anos de chumbo. “Ditadura No Ar” reúne as quatro edições da minissérie independente ganhadora do Troféu HQMix, mas com artes e textos revisados. O roteiro policial é de Raphael Fernandes e a arte é de Rafael Vasconcellos, o Abel.
(3) “As Barbas do Imperador” (Lilia Moritz Schwarcz e Spacca)
O livro “As barbas do Imperador”, da historiadora e antropóloga Lilia Moritz Schwarcz, foi lançado em 1998 e logo se tornou um marco na historiografia brasileira. O livro mostra o mito monárquico ao descrever a construção dos palácios, a mistura de ritos franceses com costumes brasileiros, como a boa sociedade se civilizava, a criação de medalhas, emblemas, dísticos e brasões, a participação do monarca e o uso de sua imagem em festas populares. Nesta edição em quadrinhos do livro, lançado em 2014, Schwarcz volta à parceria com o premiado ilustrador Spacca, na dobradinha que já rendeu o best-seller “D. João Carioca”, também HQ. Muito utilizado por professores do Ensino Básico.
(4) “Castanha do Pará” (Gidalti Jr.)
O romance gráfico “Castanha do Pará” reconta, em forma de fábula, uma situação cada vez mais comum atualmente: Castanha é um menino-urubu que vive suas aventuras pelos cenários do tradicional mercado público Ver-o-Peso, em Belém. Mora sob o céu aberto e sobrevive dos furtos e das migalhas de atenção que sobram do mundo ao seu redor. O romance gráfico de estreia de Gidalti Moura Jr. uma visão lúdica e ritmada da realidade.
(5) “Jubiabá” (Jorge Amado e Spacca)
Este clássico romance brasileiro do escritor baiano Jorge Amado escrito entre 1934 e 1935 foi adaptado para uma história em quadrinhos pelo artista Spacca. A história se passa na Bahia no início do século XX e conta a história de um jovem negro chamado Antônio Balduíno, que sonha em se tornar um percussionista famoso. Além de estudar profundamente o romance de Jorge Amado, Spacca se baseou num extenso material sobre a Salvador de antigamente: livros de arte, de fotos, mapas e também outras obras de Jorge Amado. Spacca viajou ainda a Salvador, onde consultou a Fundação Gregório de Matos sobre aspectos da Salvador dos anos 1920.
(6) “A Guerra dos Farrapos” (Alexandre de Maio e Tabaja Ruas)
A Revolução Farroupilha é um dos mais importantes eventos históricos do Brasil e “A Guerra dos Farrapos” é uma quadrinização da epopeia rio-grandense. Escrita por Tabajara Ruas, esta adaptação traça um panorama que contempla os principais aspectos e personagens da guerra civil de 1835, reconstituída no traço de Flavio Colin.
(7) “Grande Sertão: Veredas” (Eloar Guazzelli e Rodrigo Rosa)
Nova edição do clássico do século XX adaptado para os quadrinhos chega pela Globo Livros Graphic. O livro, que levou o prêmio HQ Mix 2015 de melhor adaptação para os quadrinhos, tem roteiro do ilustrador, artista plástico e diretor de cinema Eloar Guazzelli, além da arte de Rodrigo Rosa. Ele respeita o texto original de Guimarães Rosa, mantendo a linguagem (que é uma marca) do autor mineiro.
(8) “Contra tempo – uma viagem de 200 anos” (Ana Cardoso, Hyna Crimson, Igor Marques e João Paulo Garrido Pimenta)
A jovem estudante de História Beatriz viaja no tempo para salvar o Brasil de um conjunto de retrocessos vividos em sua História contemporânea. Na viagem, a jovem ajuda a contar outras histórias sobre o bicentenário da Independêcia e se depara com os conflitos sociais de cada época. Em sua jornada pelo passado, Bia tem a oportunidade de viver na pele fatores que ajudaram a constituir o Brasil atual. Seu trunfo é ter o poder de transformá-lo. É possível fazer a leitura online da HQ neste site.
Marcelo D’Salete
Um de nossos autores preferido é o paulista Marcelo D’Salete, um dos autores de HQs mais premiados e reconhecidos da atualidade, no Brasil e no exterior. D’Salete tem formação em História da Arte, usa pesquisa historiográfica para escrever suas histórias e desempenha um papel de intelectual. Costuma visitar escolas, participa de feiras literárias, escreve artigos e participa de debates. Aqui estão três HQs dele:
(9) “Cumbe”
Coletânea de histórias que se passam durante a escravidão no Brasil. Cada uma das histórias apresenta um personagem diverso e trata de vários aspectos da vida de escravos e libertos no Brasil do século XIX. As histórias são bem fundamentadas e detalhadas, com um traço forte e expressivo que captura as emoções e os conflitos dos personagens.
(10) “Angola Janga: Uma História de Palmares”
HQ baseada na história do Quilombo dos Palmares, um dos maiores movimentos de resistência negra da história do Brasil. A narrativa acompanha a vida do líder Zumbi dos Palmares, apresentando as batalhas e táticas empregadas pelos quilombolas para se defender dos ataques dos colonizadores. A história apresenta uma visão profunda da vida e da cultura dos escravos fugidos no Brasil do século XVII.
(11) “Noite Luz”
Em ‘Noite Luz’, todos estão mortos e o protagonista é um onipresente sentimento de fatalidade nas pessoas que vagam pela noite, pelas ruas ou presas às suas condições sociais. Visa discutir-se a violência, a urbanidade e a possível fantasmagoria das pessoas nas grandes cidades.
Parte dos resumos acima se basearam em releases das editoras e autores.